Questões de Português - Colocação Pronominal para Concurso
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Ética de princípios.
Rubem Alves
AS DUAS ÉTICAS: a ética que brota da contemplação das estrelas perfeitas, imutáveis e mortas, a que os filósofos dão o nome de ética de princípios, e a ética que brota da contemplação dos jardins imperfeitos e mutáveis, mas vivos - a que os filósofos dão o nome de ética contextual.
Os jardineiros não olham para as estrelas. Eles nada sabem sobre os estrelas que alguns dizem já ter visto por revelação dos deuses. Como os homens comuns não veem essas estrelas, eles têm de acreditar na palavra dos que dizem já as ter visto longe, muito longe ... Os jardineiros só acreditam no que os seus olhos veem. Pensam a partir da experiência: pegam a terra com as mãos e a cheiram...
Vou aplicar a metáfora a uma situação concreta. A mulher está com câncer em estado avançado. É certo que ela morrerá. Ela suspeita disso e tem medo. O médico vai visitá-la. Olhando, do fundo do seu medo, no fundo dos olhos do médico ela pergunta: “Doutor, será que eu escapo desta?”
Está configurada uma situação ética. Que é que o médico vai dizer? Se o médico for um adepto da ética estrelar de princípios, a resposta será simples. Ele não terá que decidir ou escolher. O princípio é claro: dizer a verdade sempre. A enferma perguntou. A resposta terá de ser a verdade. E ele, então, responderá: “Não, a senhora não escapará desta. A senhora vai morrer ...”. Respondeu segundo um princípio invariável para todas as situações.
A lealdade a um princípio o livra de um pensamento perturbador: o que a verdade irá fazer com o corpo e a alma daquela mulher? O princípio, sendo absoluto, não leva em consideração o potencial destruidor da verdade. Mas, se for um jardineiro, ele não se lembrará de nenhum princípio. Ele só pensará nos olhos suplicantes daquela mulher. Pensará que a sua palavra terá que produzir a bondade. E ele se perguntará: “Que palavra eu posso dizer que, não sendo um engano - 'A senhora breve estará curada ...' -, cuidará da mulher como se a palavra fosse um colo que acolhe uma criança?” E ele dirá: “Você me faz essa pergunta porque você está com medo de morrer. Também tenho medo de morrer ...”. Aí, então, os dois conversarão longamente - como se estivessem de mãos dadas ... - sobre a morte que os dois haverão de enfrentar.
Com o sugeriu o apóstolo Paulo, a verdade está subordinada à bondade. Pela ética de princípios, o uso da camisinha, a pesquisa das células-tronco, o aborto de fetos sem cérebro, o divórcio, a eutanásia são questões resolvidas que não requerem decisões: os princípios universais os proíbem. Mas a ética contextual nos obriga a fazer perguntas sobre o bem ou o mal que uma ação irá criar. O uso da camisinha contribui para diminuir a incidência da Aids? As pesquisas com células-tronco contribuem para trazer a cura para uma infinidade de doenças? O aborto de um feto sem cérebro contribuirá para diminuir a dor de uma mulher? O divórcio contribuirá para que homens e mulheres possam recomeçar suas vidas afetivas? A eutanásia pode ser o único caminho para libertar uma pessoa da dor que não a deixará?
Duas éticas. A única pergunta a se fazer é: “Qual delas está mais a serviço do amor?”
Pais e filhos: tão perto, tão longe
Valdeli Vieira
A sociedade contemporânea se assenta, segundo vários pensadores das ciências humanas, por uma polaridade: de um lado o excesso, de outro a falta. No entanto, há muitos anos a psicanálise nos ensina: todo excesso esconde uma falta. Vivemos um momento sócio-histórico de excessos de trabalho, compromissos, desejos, expectativas e estímulos que atingem indistintamente crianças, adolescentes e adultos.
Vivemos ocupados, com agendas cheias de cursos, reuniões, compromissos e atividades extracurriculares. Não há tempo a perder e nunca antes tivemos tanto a sensação de estarmos correndo em busca do tempo perdido. A excelência de desempenho acompanha a todos na escola, no trabalho, nos demais ambientes em que estamos inseridos. Estamos conectados permanentemente e devemos estar disponíveis todo o tempo.
Esse ambiente de estimulação e exigências constantes, no qual às vezes damos conta das demandas que nos são impostas por nós mesmos ou pelo outro, e outras vezes não, tem uma única consequência a todos: a exaustão.
Exaustos, ao chegarmos a casa, só queremos ficar mergulhados no nosso mundo, para de certa forma termos (ainda que na nossa fantasia) uma compensação pelas frustrações enfrentadas ao longo do dia. E é nesse ponto que começamos a nos distanciar do nosso parceiro e dos nossos filhos, porque passamos a nos tornar indisponíveis ao outro.
Educar filhos, formá-los, é tarefa para a vida inteira e exige disposição, tempo, vitalidade e dedicação, e o fato é que, embora na teoria estejamos todos comprometidos com isso, na prática nem sempre estamos dispostos. Terceirizamos essas tarefas para professores, psicólogos, avós e babás. E, quando não temos essas pessoas à disposição, silenciamos as crianças dando-lhes a possibilidade de passar horas diante de alguma telinha: se antes era a televisão, hoje vemos crianças em idades cada vez mais precoces com um Ipad na mão. Não queremos ser perturbados no nosso mundo, no nosso silêncio e, sem percebermos, vamos criando abismos nas nossas relações.
(Valdeli Vieira Pais e filhos: tão perto, tão longe (adaptado) REVISTA E: https://www.sescsp.org.br/online/artigo/13291_PAISEFILHOS. Acesso 10.06.2019)
Ameaças globais
A mudança climática continua sendo percebida como a maior ameaça global, diz o Pew Research Center. Realizado no ano passado com mais de 27 mil pessoas em 26 países, o estudo indicou um fortalecimento dessa percepção. Em 2013, 56% viam o aquecimento global como uma grande ameaça. Em 2017, eram 63%. No ano passado, o porcentual foi de 67%. No Brasil, 72% apontaram a mudança climática como uma relevante ameaça global.
Confirma-se, assim, que o mundo está cada vez mais preocupado com a sustentabilidade do planeta, o que tem muitas consequências sociais, políticas e econômicas. Por exemplo, os governos que se mostrarem alheios ou contrários a essa preocupação estarão contrariando os sentimentos de sua própria população, além de se colocarem na contramão da história. Outro inegável efeito é que, com populações cada vez mais atentas a questões ambientais, ampliar o acesso a novos mercados exige o compromisso de melhorar as práticas ambientais. Ser indiferente ao meio ambiente é um meio de um país se isolar na esfera internacional.
Além do aquecimento global, o terrorismo foi outra grande preocupação constatada na pesquisa. Em oito países, entre eles, Rússia, França, Indonésia e Nigéria, o Estado Islâmico foi visto como o maior risco global. Também cresceu a preocupação com os ataques cibernéticos. Em quatro países, incluindo Estados Unidos e Japão, o risco cibernético foi a preocupação internacional mais citada.
No mundo inteiro, cresceu a preocupação com o poder e a influência dos Estados Unidos. Em dez países, metade ou mais das pessoas entrevistadas afirmou que o poder americano é uma grande ameaça ao seu país. Foi a maior mudança de sentimento entre as ameaças globais avaliadas. Na Alemanha, o crescimento foi de 30%; na França, de 29%; no Brasil e no México, de 26%.
O estudo revelou um dado interessante a respeito da percepção sobre o risco envolvendo a situação da economia global. Embora seja citado em muitos lugares como uma ameaça significativa, tal perigo não é visto em nenhum país como a principal ameaça. O Pew Research Center destacou que isso ocorreu mesmo naqueles países em que as economias nacionais tiveram avaliações especialmente negativas, como a Grécia e o Brasil.
Tem-se, assim, que a avaliação que a população de um país faz sobre as ameaças globais pode não ser muito objetiva. Às vezes, há perigos que as pessoas não querem ver. Tal fato mostra a importância de os governos atuarem de forma responsável, com base em dados empíricos e estudos consistentes. Nesta situação, ideologias não são um bom parâmetro para a análise de riscos.
(O Estado de S. Paulo. 17.02.2019. Adaptado)
Considere as frases elaboradas a partir das ideias do texto.
• Um estudo sobre as ameaças globais sempre foi imprescindível e, em 2013, o Pew Research Center já havia realizado um estudo dessa natureza.
• Há um crescente temor manifestado pela população mundial, e os resultados referentes às alterações climáticas comprovaram esse crescente temor dos cidadãos.
• O descaso com a sustentabilidade do planeta é uma irresponsabilidade, e os governos que demonstram esse descaso são uma ameaça ao futuro da humanidade.
De acordo com o emprego e a colocação dos pronomes estabelecidos pela norma-padrão, os trechos destacados podem ser substituídos, correta e respectivamente, por:
[Pai e filho]
No romance Paradiso o grande escritor cubano José Lezama Lima diz que um ser humano só começa a envelhecer depois da morte do pai. Freud atribui a essa morte um dos grandes traumas de um filho.
A amizade e a cumplicidade quase sempre prevalecem sobre as discussões, discórdias e outras asperezas de uma relação às vezes complicada, mas sempre profunda. Às vezes você lamenta não ter conversado mais com o seu pai, não ter convivido mais tempo com ele. Mas há também pais terríveis, opressores e tirânicos.
Exemplo desse caso está na literatura, na Carta ao pai, de Franz Kafka. É esse um dos exemplos notáveis do pai castrador, que interfere nas relações amorosas e na profissão do filho. Um pai que não se conforma com um grão de felicidade do jovem Franz. A Carta é o inventário de uma vida infernal. É difícil saber até que ponto o pai de Kafka na Carta é totalmente verdadeiro. Pode se tratar de uma construção ficcional ou um pai figurado, mais ou menos próximo do verdadeiro. Mas isso atenua o sofrimento do narrador? O leitor acredita na figuração desse pai. Em cada página, o que prevalece é uma alternância de sofrimento e humilhação, imposta por um homem prepotente e autoritário.
(Adaptado de: HATOUM, Milton. Um solitário à espreita. São Paulo: Companhia das Letras, 2013, p. 204-205)
A era das compras
A economia capitalista moderna deve aumentar a produção constantemente, se quiser sobreviver, como um tubarão que deve nadar para não morrer por asfixia. Mas a maioria das pessoas, ao longo da história, viveu em condições de escassez. A fragilidade era, portanto, sua palavra de ordem. A ética austera dos puritanos e a dos espartanos são apenas dois exemplos famosos. Uma pessoa boa evitava luxos e nunca desperdiçava comida. Somente reis e nobres se permitiam renunciar publicamente a tais valores e ostentar suas riquezas.
O consumismo vê o consumo de cada vez mais produtos e serviços como algo positivo. Encoraja as pessoas a cuidarem de si mesmas, a se mimarem e até a se matarem pouco a pouco por meio do consumo exagerado. A frugalidade é uma doença a ser curada. Não é preciso olhar muito longe para ver a ética do consumo em ação – basta ler a parte de trás de uma caixa de cereal: “Para uma refeição saborosa no meio do dia, perfeita para um estilo de vida saudável. Um verdadeiro deleite com o sabor maravilhoso do “quero mais!”.
Durante a maior parte da história, as pessoas teriam sido repelidas, e não atraídas, por esse texto. Elas o teriam considerado egoísta, indecente e moralmente corrupto. O consumismo trabalhou duro, com a ajuda da psicologia e da vontade popular, para convencer as pessoas de que a indulgência com os excessos é algo bom, ao passo que a frugalidade significa auto-opressão.
(Adaptado de: HARARI, Yuval Noah. Sapiens – uma breve história da humanidade. 38. ed. Porto Alegre: L&PM, 2018, p. 357-358)
Ao analisar os hábitos de consumo, o autor do texto avalia esses hábitos de consumo contrapondo os mesmos aos hábitos de consumo que havia em épocas de maior frugalidade.
Evitam-se as viciosas repetições da frase acima substituindo-se os elementos sublinhados, na ordem dada, por:
Volta às aulas para pais e filhos
A socióloga Annette Lareau afirma que, nos Estados Unidos, a classe social das famílias tem uma influência decisiva sobre a trajetória escolar de seus filhos, mesmo ao comparar somente alunos da rede pública.
Em suas pesquisas, Lareau constatou que, embora a educação seja valorizada por todos, as medidas tomadas para buscar o sucesso acadêmico dos filhos variam de acordo com a renda familiar.
Enquanto na classe média era incentivado o debate em casa, além da inclusão de atividades extracurriculares e vivências que cultivassem habilidades e um olhar crítico, os pais das classes mais baixas tendiam a valorizar mais a obediência, a convivência com a família e o livre brincar. Embora essas atividades cultivem a autonomia e a criatividade, são menos valorizadas nas escolas.
A relação entre os pais e o colégio também diferia bastante. Os de classe média acreditavam ser de sua responsabilidade administrar a vida estudantil dos filhos, intervindo quando necessário junto à instituição.
Já as famílias com menor renda atribuíam à escola esse papel. Segundo Lareau, ainda que razoável, essa atitude não é vantajosa, pois os professores muitas vezes interpretavam a ausência dos pais como sinal de descaso.
Famílias das camadas mais pobres tendem a conhecer pouco o funcionamento da escola - e seus esforços, em alguns casos, tornam-se invisíveis no universo escolar. Já os colégios e seus agentes sentem-se ignorados pelas famílias.
Na sociedade do conhecimento, a troca de informações entre escola e família é fundamental. Um primeiro passo é facilitar a comunicação entre pais e professores, algo que pode ser feito por grupos de redes sociais e aplicativos de celular.
Ao convidar os pais para conversar, a escola transmite informações importantes, como explicações sobre o processo de aprendizagem, quais os resultados esperados e como a família pode apoiar os alunos em casa. Escolas que adotaram esses exemplos demonstram bons resultados.
À medida que assumem que a responsabilidade pela educação é compartilhada, pais e escola estabelecem uma relação de apoio mútuo que favorece a todos.
(M aria Alice Setúbal. https://www1 .folha.uol.com.br. Adaptado)
Redes sociais e aplicativos são meios bem-sucedidos de interação, e há escolas que adotaram esses meios, o que têm revelado boas perspectivas. A responsabilidade pela educação, quando assumida por todos, garante a pais e escolas muitos benefícios.
De acordo com o emprego e a colocação dos pronomes estabelecidos pela norma-padrão, os trechos destacados no texto podem ser substituídos por:
Não sei a sua, mas a minha memória, quando precisa trabalhar em minha própria causa, é preguiçosa, lenta, finge que não é com ela. Minha força de vontade, então, coitada, é uma comédia de mau gosto, boa em me deixar envergonhada, dá uma novela o que eu já passei com ela. Por outro lado, nunca me esqueci dos horários dos remédios dos meus filhos. Nunca atrasei para cumprir um prazo da minha agenda profissional, e, menos ainda, deixei sem fazer qualquer uma das tarefas no trabalho ou em casa. Para as responsabilidades do ganha-pão e dos compromissos com a família, não me permito errar. Sou pontual. Com todos menos comigo. É assim, comigo eu falho mesmo.
São exemplos bobos, mas refletem a fragilidade de nossos impulsos, sentimentos, decisões. Mas, principalmente, mostram a falta de amor, carinho e afeto com nós próprios. E a vida vai passando e você vai se esquecendo disso, abandonando, pouco a pouco, a si mesma. Tudo e todos são importantes e merecem o seu tempo, a sua disposição, o seu sorriso. Tem dias, sinceramente, que não dou nem um sorriso para mim. À noite, desmonto morta na cama. Meus pés pedem um carinho, um toque, massagem. Estou cansada demais para atendê-los. Bem na hora que seria deles, os heróis que me carregaram o dia todo, eu não tenho mais forças. Vou dormir sem esse deleite, não me mexo em busca de algo tão simples. Tão fácil.
Mas é preciso lembrar que temos direito a esses rituais de agrado, aconchego, bem-estar e acolhida. Não é uma crônica para narcisos. É uma crônica para quem não se ama da forma como deveria se amar, se respeitar, se bem querer. Para quem se esqueceu...
Portanto, hoje, ainda, sente-se no sofá e esfregue seus pezinhos com um creme bem cheiroso. E não ligue para o que vão dizer. Apenas se ame.
(Elma E. Bassan Mendes. Eu me amo? Diário da Região,
23.02.2019. Adaptado)
As orações em (a) e (b) estão corretas, de acordo com a norma padrão escrita, relativamente à colocação pronominal.
(a) Sempre me disseram que isso era verdade.
(b) Quem nos fará pensar diferentemente?
A respeito dos sentidos e dos aspectos linguísticos do texto CG1A1AAA, julgue o item a seguir.
A correção gramatical do texto seria preservada caso
se substituísse “nos tornamos” (l.33) por tornamo-nos.
Considerando os aspectos linguísticos do texto precedente e as informações nele veiculadas, julgue o próximo item.
A correção gramatical do texto seria prejudicada caso
se deslocasse a partícula “se”, em “se dizia” (ℓ.4),
para imediatamente após a forma verbal: dizia-se.
Com relação às ideias e aos aspectos linguísticos do texto precedente, julgue o item a seguir.
Na linha 18, o deslocamento do termo “se” para imediatamente
após a forma verbal “pode” — pode-se — comprometeria a
correção gramatical do texto.
Quanto ao discurso do personagem:
I. É possível identificar o uso formal da próclise; II. Há uma conjugação inadequada posterior ao pronome pessoal ―''me''; III. Houve uma supressão de fonemas no verbo ―''estar'' presente no texto.
Está(ão) correto(s) o(s) item(ns):
Texto para o item
Quanto à correção gramatical e à coerência das substituições propostas para vocábulos e trechos destacados do texto, julgue o item.
“se transformou” (linha 5) por transformou‐se.
Texto 1
Como ler os clássicos?
§ 1º Em recente artigo para o jornal The New York Times, o novelista Brian Morton compara a leitura dos grandes escritores do passado a uma viagem no tempo, na qual o aventureiro deve mover-se com cautela, sem jamais tentar impor os seus costumes aos nativos de um longínquo período da história, cujas práticas não correspondem às nossas.
§ 2º Segundo o autor, isso não quer dizer que escritores antigos estejam imunes à crítica contemporânea, como se a autoridade do cânone em relação à crítica seguisse um critério de mérito por antiguidade, a partir do qual um texto deva ser protegido a qualquer custo — pelo simples fato de ter sobrevivido às mais diversas provas de resistência ao tempo.
§ 3º Ora, por mais antigo que seja, nenhum texto está isento de reinterpretações e críticas. Exemplo disso é o que nos propõe o estudioso Harold Bloom em “O Livro de J”, em que discorre sobre a possibilidade de alguns trechos do Pentateuco (os cinco primeiros livros da Bíblia) terem sido compostos por uma mulher.
§ 4º Assim, Morton recomenda que a crítica não se antecipe ao bom exercício da leitura. Algo raro nos dias de hoje, em que muitas vezes se opta por boicotar certas obras antes mesmo de confrontá-las por méritos artísticos específicos e prováveis limitações de fundo ético. Exemplo disso são seus estudantes que evitam a leitura de Edith Wharton (autora de “A Casa da Alegria”) e Dostoiévski, sob o pretexto de que qualquer suspeita de antissemitismo deveria ser banida da literatura.
§ 5º Ao referir-se a esse problema, Morton argumenta que, embora a crescente oposição dos estudantes seja alimentada por uma genuína sede de justiça social, a sobrevivência dos clássicos em departamentos de literatura não seria motivada pela pulsão reacionária de velhos professores, mas pela necessidade de compreendermos o terreno em que a criatividade humana se manifesta em um dado contexto histórico e cultural.
§ 6º Não há dúvidas de que as grandes vozes literárias do passado tenham uma visão de mundo limitada por preconceitos de época. Dessa queixa nem mesmo o mais precavido dos nossos contemporâneos conseguiria se safar! Afinal, o filósofo alemão Friedrich Nietzsche já declarava ser inevitável que todos os grandes espíritos estivessem ligados aos seus tempos por meio de algum preconceito.
§ 7º Mesmo assim, Morton ressalta que ainda temos muito a ganhar com a cuidadosa leitura desses textos que hoje são tidos por controversos. Segundo o autor, esse ganho se traduziria em um exercício de humildade a partir do qual o exame de um passado literário nos tornaria capazes de refletir sobre as limitações das práticas artísticas e dos costumes morais da nossa própria época.
§ 8º Em um diálogo de 2017 com o psicólogo Jordan Peterson, Camille Paglia faz uma observação complementar ao ressaltar que um texto não resiste ao tempo por imposição de uma elite cultural, mas por meio do seu constante uso pela tradição, enquanto referência à prática literária corrente. Ou seja, aquilo que nós consideramos grande arte é determinado pelas necessidades dos próprios artistas.
§ 9º Ao adotar-se o raciocínio de Paglia, chega-se à conclusão de que a permanência de autores como Homero e Shakespeare no cânone literário não seria consequência de uma conspiração do poder político e acadêmico para privilegiar determinados escritores em detrimento de outros. Isso decorre, portanto, da vitalidade das suas influências ao longo da história.
§ 10. Homero é um dos autores mais relevantes do cânone pelo fato de suas criações servirem de inspiração para escritores outros de épocas diversas. Desde os dramaturgos da antiga Grécia — como Ésquilo, que disse que suas peças não passavam de migalhas do banquete homérico — e Virgílio, o romano, até escritores modernos como o poeta e historiador britânico Robert Graves, autor de “A Filha de Homero”, e a escritora canadense Margaret Atwood com o seu “The Penelopiad”.
§ 11. Da mesma forma, Shakespeare teria influenciado outros escritores desde o seu advento, passando pelo teatro alemão do século 18 — por exemplo, tragédias históricas como “Götz von Berlichingen” e “Egmont” de Goethe — até o cinema japonês do século 20, em filmes do diretor Akira Kurosawa — tanto “Trono Manchado de Sangue” como “Ran”, cujos roteiros são adaptações dos dramas “Macbeth” e “Rei Lear”.
§ 12. Compreender essa teia de influências e associações é uma das tarefas mais difíceis do professor e crítico literário, cuja função mais ampla é a de oferecer ao público uma chave de leitura que seja simultaneamente plausível e criativa, sem que para isso tenha a necessidade de extrapolar os limites de uma obra — ora atribuindo ao texto características inexistentes, ora interpretações anacrônicas —, como se a própria obra e o seu contexto histórico não fossem capazes de despertar a fome literária do leitor.
§ 13. Desde o começo do meu doutorado, reflito sobre a melhor forma de ler e ensinar os clássicos da literatura alemã. Assim, durante o período em que me dedico aos alunos, como nas horas em que desenvolvo a minha tese, busco aplicar uma síntese das duas estratégias abordadas neste pequeno ensaio, quais sejam: a reconstrução de um contexto histórico específico na tentativa de emprestar uma ordem ao emaranhado de influências artísticas e filosóficas necessárias para o entendimento de autores como Goethe.
§ 14. Nesse afã, dedico a maior parte das minhas horas de estudo à versão de Goethe de “Ifigênia em Táuris”. Exercício em que procuro entender o contexto histórico de cada uma das versões dessa tragédia, ao mesmo tempo em que traço uma narrativa mais ampla sobre a recepção do texto original de Eurípides na Alemanha do século 18.
§ 15. Contudo, atento aos detalhes da versão de Goethe, que se distancia tanto do texto euripidiano como de outras versões da época, buscando ressaltar as qualidades morais atribuídas à protagonista, cujas atitudes revelam um importante questionamento sobre a relação entre gênero e autonomia na obra do escritor alemão.
§ 16. Goethe é um dos muitos autores clássicos arbitrariamente criticados pelas suas representações do feminino. No entanto, quanto mais tempo dedico ao estudo da sua obra, mais noto que determinadas críticas não fazem o menor sentido.
§ 17. Isso prova que, muitas vezes, a reputação de um escritor canônico entre os nossos contemporâneos apenas revela a inabilidade de nossa época em reconhecer os raros, porém eficientes, esforços do passado na promoção das liberdades que hoje consagramos.
§ 18. Não se trata de uma simples coincidência que Goethe tenha sido uma importante referência literária para a escritora George Eliot, autora de “Middlemarch”, ou que Elena Ferrante, na atualidade, tome uma citação de “Fausto” como a epígrafe de “A Amiga Genial”, o primeiro dos quatro volumes da ilustre série napolitana — uma espécie de “bildungsroman” (romance de formação ou amadurecimento) para os nossos tempos, sobre a busca de duas amigas por autoconhecimento e liberdade!
ALBURQUEQUE, Juliana de. Folha de S. Paulo, 26 mar. 2019.
Texto retirado da obra “Raízes do Brasil” para responder à questão.
Texto CB1A1-III
A respeito dos sentidos e dos aspectos linguísticos do texto CB1A1-III, julgue o item subsecutivo.
Em “dirigiu-se” (ℓ.7), a colocação do pronome “se” antes da
forma verbal — se dirigiu — prejudicaria a correção
gramatical do texto.
Na sintaxe da língua portuguesa, a colocação pronominal diz respeito ao modo como se dispõem os pronomes em relação aos demais elementos de uma oração. Há três tipos de posição que os pronomes átonos podem ocupar na oração: antes (próclise), depois (ênclise) e no meio (mesóclise) do verbo.
A esse respeito, leia a ti rinha.
Analise as asserções a seguir e a relação proposta entre elas.
I. No primeiro quadrinho, segundo os gramáticos, a colocação do pronome oblíquo átono está correta
PORQUE,
II. na frase em que foi empregada, a próclise é preferida, pois o verbo vem antecedido do advérbio
“que”
Sobre as asserções, é correto afirmar que
Julgue o item a seguir no que se refere à correção gramatical e à coerência da proposta de reescrita para cada um dos trechos destacados do texto.
“começam a se interessar” (linha 4): começam a interessar‐se.