O texto a seguir foi extraído do livro O pároco de aldeia, de Alexandre Herculano. Leia-o atentamente
para responder as próximas questões.
“Como a filosofia é triste e árida! Como a florinha do
campo, a alma por onde passou a procela da filosofia,
esse turbilhão transitório de doutrinas, de sistemas,
de opiniões, de argumentos, pende desanimada e
tristonha; e na claridade baça do ceticismo, que torna
pesada e fria a atmosfera da inteligência, não pode
aquecer-se aos raios esplêndidos do sol de uma crença viva. Com Kant, o universo é uma dúvida: com Locke, é dúvida o nosso espírito: e num destes abismos
vêm precipitar-se todas as antologias. Como a filosofia
é triste e árida! A árvore da ciência, transplantada do
Éden, trouxe consigo a dor, a condenação e a morte;
mas a sua pior peçonha guardou-se para o presente:
foi o ceticismo. Feliz a inteligência vulgar e rude, que
segue os caminhos da vida com os olhos fitos na luz e
na esperança postas pela religião além da morte, sem
que um momento vacile, sem que um momento a luz
se apague ou a esperança se desvaneça! Feliz a alma
vulgar e rude que crê e nem sequer sabe que a dúvida
existe no mundo! Para ela, as noites não têm os pesadelos monstruosos, nem os dias a meditações febris
em que o cético involuntário se debate na orla do possível, que toca por um lado nas solidões do nada, por
outro na imensidade de Deus. Mas ainda mais feliz a
inteligência superior às do vulgo, aquela que a Providência destinou à missão do poeta, nos anos da infância e da juventude, antes que o bafo árido da ciência a
queimasse, passando por cima dela!”
(Trecho com adaptações).