Questões Militares de Português - Interpretação de Textos
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Números da fome
A nova edição do relatório “O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo”, recém-divulgada pela ONU, tem um tom soturno. Constata-se ali que a recuperação econômica em 2021, após o pior momento na pandemia, não deteve a expansão global da fome.
Com o impulso dos impactos da covid-19, a parcela da população mundial enfrentando insegurança alimentar grave – fome – subiu de 9,3% para 10,9% em 2020. Em vez de cair ou se estabilizar, a cifra foi a 11,7% no ano passado. E, como aponta o documento, ainda estão por serem computados os efeitos da guerra na Ucrânia.
A piora é generalizada, mas os números mais alarmantes, previsivelmente, estão na África, na América Latina e na Ásia. E a desigualdade não é apenas regional.
“Grupos desfavorecidos da população, como mulheres, jovens, trabalhadores de baixa qualificação e empregados no setor informal, foram desproporcionalmente afetados pela pandemia e pelas medidas sanitárias”, avalia o relatório das Nações Unidas.
Dito de outro modo, os vulneráveis perderam mais quando a economia parou e recuperaram menos quando as atividades voltaram. Em resumo, as disparidades de renda se agravaram.
O Brasil, claro, não ficaria imune a tal processo – ao qual acrescenta suas mazelas particulares.
Ainda que seus números não se destaquem entre os piores do planeta ou do continente, o país mostra deterioração aguda quando se faz uma comparação de prazo mais longo. Entre 2014 e 2016, 1,9% dos brasileiros passavam fome; no período 2019-21, a proporção subiu a 7,3%, ou 15,4 milhões de pessoas.
O desempenho da economia, que tem sido abaixo de medíocre há quase uma década, decerto explica grande parte da degradação. Mais recentemente, a escalada inflacionária agravou o quadro.
(Editorial. Folha de S.Paulo, 09.07.2022. Adaptado)
Números da fome
A nova edição do relatório “O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo”, recém-divulgada pela ONU, tem um tom soturno. Constata-se ali que a recuperação econômica em 2021, após o pior momento na pandemia, não deteve a expansão global da fome.
Com o impulso dos impactos da covid-19, a parcela da população mundial enfrentando insegurança alimentar grave – fome – subiu de 9,3% para 10,9% em 2020. Em vez de cair ou se estabilizar, a cifra foi a 11,7% no ano passado. E, como aponta o documento, ainda estão por serem computados os efeitos da guerra na Ucrânia.
A piora é generalizada, mas os números mais alarmantes, previsivelmente, estão na África, na América Latina e na Ásia. E a desigualdade não é apenas regional.
“Grupos desfavorecidos da população, como mulheres, jovens, trabalhadores de baixa qualificação e empregados no setor informal, foram desproporcionalmente afetados pela pandemia e pelas medidas sanitárias”, avalia o relatório das Nações Unidas.
Dito de outro modo, os vulneráveis perderam mais quando a economia parou e recuperaram menos quando as atividades voltaram. Em resumo, as disparidades de renda se agravaram.
O Brasil, claro, não ficaria imune a tal processo – ao qual acrescenta suas mazelas particulares.
Ainda que seus números não se destaquem entre os piores do planeta ou do continente, o país mostra deterioração aguda quando se faz uma comparação de prazo mais longo. Entre 2014 e 2016, 1,9% dos brasileiros passavam fome; no período 2019-21, a proporção subiu a 7,3%, ou 15,4 milhões de pessoas.
O desempenho da economia, que tem sido abaixo de medíocre há quase uma década, decerto explica grande parte da degradação. Mais recentemente, a escalada inflacionária agravou o quadro.
(Editorial. Folha de S.Paulo, 09.07.2022. Adaptado)
Números da fome
A nova edição do relatório “O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo”, recém-divulgada pela ONU, tem um tom soturno. Constata-se ali que a recuperação econômica em 2021, após o pior momento na pandemia, não deteve a expansão global da fome.
Com o impulso dos impactos da covid-19, a parcela da população mundial enfrentando insegurança alimentar grave – fome – subiu de 9,3% para 10,9% em 2020. Em vez de cair ou se estabilizar, a cifra foi a 11,7% no ano passado. E, como aponta o documento, ainda estão por serem computados os efeitos da guerra na Ucrânia.
A piora é generalizada, mas os números mais alarmantes, previsivelmente, estão na África, na América Latina e na Ásia. E a desigualdade não é apenas regional.
“Grupos desfavorecidos da população, como mulheres, jovens, trabalhadores de baixa qualificação e empregados no setor informal, foram desproporcionalmente afetados pela pandemia e pelas medidas sanitárias”, avalia o relatório das Nações Unidas.
Dito de outro modo, os vulneráveis perderam mais quando a economia parou e recuperaram menos quando as atividades voltaram. Em resumo, as disparidades de renda se agravaram.
O Brasil, claro, não ficaria imune a tal processo – ao qual acrescenta suas mazelas particulares.
Ainda que seus números não se destaquem entre os piores do planeta ou do continente, o país mostra deterioração aguda quando se faz uma comparação de prazo mais longo. Entre 2014 e 2016, 1,9% dos brasileiros passavam fome; no período 2019-21, a proporção subiu a 7,3%, ou 15,4 milhões de pessoas.
O desempenho da economia, que tem sido abaixo de medíocre há quase uma década, decerto explica grande parte da degradação. Mais recentemente, a escalada inflacionária agravou o quadro.
(Editorial. Folha de S.Paulo, 09.07.2022. Adaptado)
Ao discutir o impacto da falta de alimentos no cotidiano
da sociedade atual, o editorial argumenta que
Havia baile em São Clemente
Aurélia ali estava como sempre, deslumbrante de formosura, de espírito e de luxo. Seu trajo era um primor de elegância; suas joias valiam um tesouro, mas ninguém apercebia-se disso. O que se via e admirava era ela, sua beleza, que enchia a sala, como um esplendor.
O baile em vez de fatigá-la, ao contrário a expandia. Semelhante às flores tropicais, filhas do sol, que ostentam o brilhante matiz nas horas mais ardentes do dia, era justamente nesse pélago de luz e paixões, que Aurélia revelava toda a opulência de sua beleza.
Seixas a contemplava de parte.
As outras moças, de meia-noite em diante, começavam a fanar-se; o cansaço desbotava-lhes a cor, ou afogueava-lhes o rosto. O talhe denunciava o excesso da fadiga na languidez das inflexões ou na rispidez do gesto.
Aurélia, ao contrário, à medida que se adiantava a noite, desferia de si mais seduções, e parecia entrar na plenitude de sua graça. A correção artística de seu trajo ia desaparecendo no bulício do baile. Como o primeiro esboço que surge afinal do cinzel impetuoso do artista, ao fogo da inspiração, sua estátua recebia da admiração da turba os últimos toques.
(José de Alencar, Senhora)
Havia baile em São Clemente
Aurélia ali estava como sempre, deslumbrante de formosura, de espírito e de luxo. Seu trajo era um primor de elegância; suas joias valiam um tesouro, mas ninguém apercebia-se disso. O que se via e admirava era ela, sua beleza, que enchia a sala, como um esplendor.
O baile em vez de fatigá-la, ao contrário a expandia. Semelhante às flores tropicais, filhas do sol, que ostentam o brilhante matiz nas horas mais ardentes do dia, era justamente nesse pélago de luz e paixões, que Aurélia revelava toda a opulência de sua beleza.
Seixas a contemplava de parte.
As outras moças, de meia-noite em diante, começavam a fanar-se; o cansaço desbotava-lhes a cor, ou afogueava-lhes o rosto. O talhe denunciava o excesso da fadiga na languidez das inflexões ou na rispidez do gesto.
Aurélia, ao contrário, à medida que se adiantava a noite, desferia de si mais seduções, e parecia entrar na plenitude de sua graça. A correção artística de seu trajo ia desaparecendo no bulício do baile. Como o primeiro esboço que surge afinal do cinzel impetuoso do artista, ao fogo da inspiração, sua estátua recebia da admiração da turba os últimos toques.
(José de Alencar, Senhora)
O desemprego e a renitente crise econômica, ___________ após mais de dois anos de pandemia, têm provocado efeitos nefastos na já precária _________ habitacional da cidade de São Paulo. Para parte da população mais vulnerável, a solução entre comer e pagar o aluguel é viver em favelas – isso sem contar os que não conseguem escapar da situação de rua: o número de _________ avançou 31% durante a crise sanitária, atingindo ao menos 31.884 pessoas.
(Expulsos de casa. Editorial. Folha de S.Paulo, 27.06.2022. Adaptado)
Estamos sempre em contato com nossos sentimentos, mas a parte complicada é que nossas emoções e nossos sentimentos não são a mesma coisa. Tendemos a confundi-los, mas sentimentos são estados subjetivos internos que, falando em sentido estrito, são conhecidos apenas por aqueles que os possuem. Conheço meus sentimentos, mas não conheço os seus, exceto pelo que você me conta sobre eles. Nós nos comunicamos sobre nossos sentimentos pela linguagem. Emoções, por outro lado, são estados corporais e mentais − a raiva, o medo, a afeição, bem como a busca de vantagens − que movem o comportamento. Desencadeadas por certos estímulos e acompanhadas de mudanças comportamentais, as emoções são detectáveis externamente na expressão facial, na cor da pele, no timbre da voz, nos gestos, no odor e assim por diante. Somente quando a pessoa que experimenta essas mudanças toma consciência delas é que elas se tornam sentimentos, que são experiências conscientes. Mostramos nossas emoções, mas falamos sobre nossos sentimentos.
(Frans de Waal, O último abraço da matriarca: as emoções dos animais e o que elas revelam sobre nós.)
Nossa relação com os animais repete, de maneira invertida, os cuidados que recebemos na primeira infância. Nós também fomos, no início, dependentes, desamparados e estávamos nas mãos de uma figura prestativa e generosa, mas que tinha todo poder sobre nós. Nossa capacidade de sentir piedade vem daí. A irresistível combinação de piedade, simpatia e acolhimento que a imagem de um animal fofinho desperta em nós, também. Contudo, esse é um amor de baixa qualidade e de grande aptidão à dispersão quando falamos em um projeto de longo prazo. Animais de estimação são como filhos. Mas filhos que não crescem, não resistem para ir à escola, não reclamam por autonomias adolescentes nem vão embora para a faculdade e se casam, deixando-nos para trás.
Com os animais de estimação cada um revive a forma de amar e ser amado que Freud descreveu como narcisismo. Nele, confunde-se o amar o outro e o amar-se a si mesmo através do outro. E muitas vezes essa confusão se infiltra e atrapalha decisivamente a vida dos casais. Quando alguém declara que ama os cães a ponto de ter dois ou sete deles em casa, isso não representa nenhuma contradição com o ato de maltratá-los. Tudo depende da qualidade do laço que se estabelece nesse amor.
Quando amamos nossos cães, nossos filhos ou nossas mulheres como a nós mesmos, podemos chegar a maltratá-los da pior maneira. Daí a importância de amar o outro conferindo algum espaço para o fato de que ele é um estranho, alguém diferente de mim. O amor não é garantia nem de si mesmo nem do desejo que ele deve habilitar. Isso vai aparecer na relação com os animais, como uma espécie de raio x das nossas formas de amar. Quem trata seus animais como uma parte de si mesmo, humanizando-os realmente como filhos, chamando-os de nenês, por exemplo, pode estar indicando uma forma mais simples e narcísica de amar.
(Christian Dunker, Reinvenção da intimidade – políticas do sofrimento cotidiano. Adaptado)
MILITARES DO GRUPO ESPECIAL DE INSPEÇÃO EM VOO (GEIV)
GARANTEM SEGURANÇA DO TRÁFEGO AÉREO BRASILEIRO
1§Para garantir a segurança do tráfego aéreo brasileiro, uma equipe de militares do Grupo Especial de Inspeção em Voo (GEIV), da Força Aérea Brasileira (FAB), realiza uma espécie de fiscalização no ar, é a missão de Inspeção em Voo. As atividades acontecem por meio de aeronaves-laboratório, que, junto com radares, sistemas de aproximação, rádios, equipamentos de auxílio à navegação e luzes de orientação, proporcionam a circulação segura das aeronaves.
Subordinado ao Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), o GEIV é responsável por testar, aferir e avaliar os chamados Auxílios e os Procedimentos de Navegação Aérea e integra o Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB). O Grupo participa da homologação e verificação periódica de aproximadamente 2.268 auxílios e procedimentos, realiza inspeções em todo o território nacional e, eventualmente, em outros países da América do Sul, de voo nas fases de decolagem, rota e pouso, principalmente em condições adversas de meteorologia.
2§Em dezembro de 2021, o GEIV recebeu a terceira aeronave IU-93M, proveniente do Projeto de Modernização. A plataforma da aeronave-laboratório foi atualizada com o Sistema de Display Integrado Pro Line 21, um aviônico da Rockwell Collins que facilita o voo e aumenta a consciência situacional. O sistema faz com que as informações vitais sejam facilmente acessíveis e compreensíveis, contribuindo para o dinamismo das missões de Inspeção em Voo. Ao longo do segundo semestre de 2021, o GEIV realizou a campanha de Avaliação Operacional (AVOP) do Projeto I-X (IU50 Legacy 500), contribuindo com relevante passo na sedimentação da implantação do projeto na FAB. “Ambos os passos, tanto a AVOP do IU-50 como o recebimento do IU-93M, colocam o GEIV na direção do futuro, tornando o Grupo capaz de inspecionar todos os tipos de auxílios e procedimentos à navegação aérea, contribuindo com a evolução do SISCEAB, conforme prevê o programa SIRIUS BRASIL”, explica o Comandante do GEIV, Tenente-Coronel Aviador Bruno Michel Marcondes Alves.
http://www.portal.intraer/portalintraer/cabine/publicacoes/notaer_fevereiro_2022.pdf (adaptado)
MILITARES DO GRUPO ESPECIAL DE INSPEÇÃO EM VOO (GEIV)
GARANTEM SEGURANÇA DO TRÁFEGO AÉREO BRASILEIRO
1§Para garantir a segurança do tráfego aéreo brasileiro, uma equipe de militares do Grupo Especial de Inspeção em Voo (GEIV), da Força Aérea Brasileira (FAB), realiza uma espécie de fiscalização no ar, é a missão de Inspeção em Voo. As atividades acontecem por meio de aeronaves-laboratório, que, junto com radares, sistemas de aproximação, rádios, equipamentos de auxílio à navegação e luzes de orientação, proporcionam a circulação segura das aeronaves.
Subordinado ao Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), o GEIV é responsável por testar, aferir e avaliar os chamados Auxílios e os Procedimentos de Navegação Aérea e integra o Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB). O Grupo participa da homologação e verificação periódica de aproximadamente 2.268 auxílios e procedimentos, realiza inspeções em todo o território nacional e, eventualmente, em outros países da América do Sul, de voo nas fases de decolagem, rota e pouso, principalmente em condições adversas de meteorologia.
2§Em dezembro de 2021, o GEIV recebeu a terceira aeronave IU-93M, proveniente do Projeto de Modernização. A plataforma da aeronave-laboratório foi atualizada com o Sistema de Display Integrado Pro Line 21, um aviônico da Rockwell Collins que facilita o voo e aumenta a consciência situacional. O sistema faz com que as informações vitais sejam facilmente acessíveis e compreensíveis, contribuindo para o dinamismo das missões de Inspeção em Voo. Ao longo do segundo semestre de 2021, o GEIV realizou a campanha de Avaliação Operacional (AVOP) do Projeto I-X (IU50 Legacy 500), contribuindo com relevante passo na sedimentação da implantação do projeto na FAB. “Ambos os passos, tanto a AVOP do IU-50 como o recebimento do IU-93M, colocam o GEIV na direção do futuro, tornando o Grupo capaz de inspecionar todos os tipos de auxílios e procedimentos à navegação aérea, contribuindo com a evolução do SISCEAB, conforme prevê o programa SIRIUS BRASIL”, explica o Comandante do GEIV, Tenente-Coronel Aviador Bruno Michel Marcondes Alves.
http://www.portal.intraer/portalintraer/cabine/publicacoes/notaer_fevereiro_2022.pdf (adaptado)
Quanto à estrutura textual, avalie as afirmações e marque, em seguida, a opção correta.
I. O uso de linguagem denotativa é predominante na composição do texto.
II. O texto apresenta marcas típicas das tipologias narrativa, descritiva e injuntiva.
III. O texto traz, no último parágrafo, uma citação de autoridade para validar um posicionamento.
IV. As expressões “Em dezembro de 2021” e “Ao longo do segundo semestre de 2021” funcionam como mecanismos de sequenciação textual.
Estão corretas as afirmativas
TEXTO I
A complicada arte de ver
1§Ela entrou, deitou-se no divã e disse: “Acho que estou ficando louca”. Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. “Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões – é uma alegria.
2§Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica.
3§De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões… agora, tudo o que vejo me causa espanto.” Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as “Odes Elementales”, de Pablo Neruda. Procurei a “Ode à Cebola” e lhe disse: “Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: ‘Rosa de água com escamas de cristal’. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta…Os poetas ensinam a ver”.
4§Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física. William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo. Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”.
5§Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada veem.
6§“Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios”, escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido.
7§Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada “satori”, a abertura do “terceiro olho”. Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: “Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram”.
8§Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, “seus olhos se abriram”.
9§Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em “Operário em Construção”: “De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa – garrafa, prato, facão – era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção”.
10§A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. (...) Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras.
Rubem Alves Texto Adaptado (originalmente publicado no caderno “Sinapse” - “Folha de S. Paulo”, em 26/10/2004).
TEXTO I
A complicada arte de ver
1§Ela entrou, deitou-se no divã e disse: “Acho que estou ficando louca”. Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. “Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões – é uma alegria.
2§Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica.
3§De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões… agora, tudo o que vejo me causa espanto.” Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as “Odes Elementales”, de Pablo Neruda. Procurei a “Ode à Cebola” e lhe disse: “Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: ‘Rosa de água com escamas de cristal’. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta…Os poetas ensinam a ver”.
4§Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física. William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo. Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”.
5§Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada veem.
6§“Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios”, escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido.
7§Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada “satori”, a abertura do “terceiro olho”. Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: “Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram”.
8§Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, “seus olhos se abriram”.
9§Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em “Operário em Construção”: “De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa – garrafa, prato, facão – era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção”.
10§A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. (...) Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras.
Rubem Alves Texto Adaptado (originalmente publicado no caderno “Sinapse” - “Folha de S. Paulo”, em 26/10/2004).
Considere o fragmento abaixo (extraído do 4º parágrafo) para responder à questão.
Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física. William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”.
Qual tipo textual predomina neste trecho do texto?
TEXTO I
A complicada arte de ver
1§Ela entrou, deitou-se no divã e disse: “Acho que estou ficando louca”. Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. “Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões – é uma alegria.
2§Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica.
3§De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões… agora, tudo o que vejo me causa espanto.” Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as “Odes Elementales”, de Pablo Neruda. Procurei a “Ode à Cebola” e lhe disse: “Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: ‘Rosa de água com escamas de cristal’. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta…Os poetas ensinam a ver”.
4§Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física. William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo. Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”.
5§Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada veem.
6§“Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios”, escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido.
7§Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada “satori”, a abertura do “terceiro olho”. Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: “Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram”.
8§Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, “seus olhos se abriram”.
9§Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em “Operário em Construção”: “De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa – garrafa, prato, facão – era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção”.
10§A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. (...) Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras.
Rubem Alves Texto Adaptado (originalmente publicado no caderno “Sinapse” - “Folha de S. Paulo”, em 26/10/2004).
I- ser guiado somente pela razão. II- obter equilíbrio e ser feliz acompanhado. III- encontrar a felicidade por meio de um relacionamento amoroso. IV- ser auxiliado pela razão ou pela emoção e sentir prazer pela vida.
Está correto o que se afirma em