Questões de Português - Variação Linguística para Concurso

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Q866834 Português

                           A sociedade do medo

O filósofo Vladimir Safatle afirma que o medo se transformou em um elemento de coesão de uma sociedade refém de um discurso de crise permanente


[...]

No seu Quando as Ruas Queimam: Manifesto pela Emergência, você diz que nossa época vai passar para a história como o momento em que a crise virou uma forma de governo. Você está falando do medo que é gerado pela crise?


Sim, como efeito. É importante entender como o discurso da crise se transformou num modo de gestão social. As crises vêm para não passar. Por exemplo, nós vivemos numa crise global há oito anos. Isso do lado socioeconômico. No que diz respeito aos problemas de segurança, vivemos uma situação de emergência há quinze anos, desde 2001. Ou seja, são situações nas quais vários direitos vão sendo flexibilizados, em que os governos vão tendo a possibilidade de intervir na vida privada dos seus cidadãos em nome de sua própria segurança. É muito mais fácil você gerir uma sociedade em crise. Então, a sociedade em crise é uma sociedade, primeiro, amedrontada; segundo, é uma sociedade aberta a toda forma de intervenção do poder soberano, mesmo aqueles que quebram as regras, quebram as normas constitucionais. Como estamos em uma situação excepcional, essas quebras começam a virar coisa normal. Esses discursos a respeito da luta contra a crise são muito claros no sentido de impedir a sociedade de reagir. Não se reage porque “a situação é de crise”.


E aí entra o medo.


Exatamente. Aí entra um pouco essa maneira de transformar o medo num elemento fundamental da gestão social. Ou seja, o medo produzido, em larga medida, potencializado, administrado, gerenciado. É o gerenciamento do medo como única forma de construir coesão hoje em dia. Nós podemos construir coesão a partir da partilha de ideias; só que, quando a sociedade chega no ponto em que ela desconfia dos ideais que lhe foram apresentados como consensuais, quando desconfia das gramáticas sociais que são responsáveis pela mediação dos conflitos, não resta outra coisa a não ser um tipo de coesão negativa. Não coesão por algo que todos afirmam, mas uma coesão através de algo que todos negam. 


Quando você fala da gestão da crise, quem são os agentes? O poder constituído do Estado, os agentes financeiros, o corpo social?


De fato, o discurso da maneira como eu estava colocando pode dar um pouco a impressão de que há uma espécie de grande sujeito por trás. Eu diria que o que acontece é: nós partilhamos de um modo de existência que, por não conseguir realizar as suas próprias promessas, e também por impedir uma abertura em direção a outros modos de existência, começa a funcionar numa chave de conservação. É importante falar de modos de existência porque isso tira um pouco a figura do sujeito que delibera. 

Então temos, sei lá, o poder do Estado, a burocracia que controla o poder do Estado, o capital financeiro. É inegável que haja de fato projetos de grupos nos modos de gestão social, mas para além disso há uma coisa muito mais brutal: uma forma de racionalidade que se transformou para nós em um elemento quase natural, que faz com que todos comecem a pensar dessa maneira. Essa forma de racionalidade, que acaba operando esses processos de dominação, deixa uma situação mais complexa. Não se trata simplesmente de subverter o poder, mas de pensar de outra maneira, o que é muito mais complicado do que pode parecer.


Quais são os instrumentos de que dispomos pra romper com essa racionalidade, com esse circuito baseado no medo? O que fazer?


Tenho duas colocações a fazer. A primeira é: muitos acreditam que a melhor maneira de se contrapor a circuitos de afetos vinculados ao medo seja constituir outros circuitos vinculados aos afetos que seriam o oposto ao medo – por exemplo, a esperança. Só que aí há uma reflexão muito interessante, de toda uma tradição filosófica, de insistir que o medo e a esperança não são afetos contraditórios – são complementares. O que é o medo a não ser a expectativa de um mal que pode ocorrer? O que é a esperança a não ser a expectativa de um bem que pode ocorrer? Quem tem a expectativa de que um mal ocorra, também espera que esse mal não ocorra. Da mesma maneira, quem tem a expectativa de que um bem ocorra, teme que esse bem não ocorra. Então, a reversão contínua de um polo a outro, da esperança ao medo, é uma constante, porque são dois tipos de afetos ligados a um mesmo modo de experiência temporal. São afetos ligados à projeção de um horizonte de expectativas. Nesse sentido, toda forma de pensar o tempo de maneira simétrica vai produzir resultados simétricos. Então, um outro afeto seria necessariamente um afeto que teria uma outra relação com a ideia de acontecimento.

[...]

Freitas, Almir. Disponível em: <https://goo.gl/qggKy8>. Acesso em: 27 set. 2017 [Fragmento adaptado].

Embora o texto esteja escrito em linguagem predominantemente formal, característica da língua escrita, ele foi baseado em uma entrevista, gênero tipicamente oral.


Assinale a alternativa em cujo trecho há ocorrência de característica típica da linguagem oral.

Alternativas
Q865988 Português
O texto contém tanto palavras do registro informal do trabalhador braçal quanto palavras do registro formal do conhecimento científico. Há palavras desses dois registros em:
Alternativas
Q864825 Português
A frase abaixo que é totalmente expressa em linguagem formal é:
Alternativas
Q864385 Português

Em relação aos níveis de linguagem, pode-se afirmar que:


I - O domínio da língua padrão não implica, apenas, em dominar regras gramaticais, mas saber usar proficientemente esses conhecimentos na organização de uma correspondência oficial.

II - Dominar a língua padrão não significa, apenas, ter proficiência linguística, mas interagir como usuário da língua, tornando-se interlocutor ativo e integrante do que escreve.

III - Os textos oficiais incorporaram as mudanças da língua contemporânea e não adotam mais “o purismo gramatical”.

Analise as proposições, e marque a alternativa adequada.


Está(ão) CORRETA(S) apenas

Alternativas
Q860107 Português

                                             Oh! Minas Gerais

                        O irresistível sotaque dos mineiros me encanta.


      Sei que deveria ir mais a Minas Gerais do que vou, umas duas, três vezes ao ano. Pra rever meus parentes, meus amigos, pra não perder o sotaque.

      Sotaque que, acho eu, fui perdendo ao longo dos anos, desde aquele 1973, quando abandonei Belo Horizonte pra ir morar a mais de dez mil quilômetros de lá.

      Senti isso quando, outro dia, pousei no aeroporto de Uberlândia e fui direto na lanchonete comer um pão de queijo que, fora de brincadeira, é mesmo o mais gostoso do mundo.

      - Cê qué qui eu isquento um tiquinho procê?

      Foi assim que a mocinha me recebeu, quase de braços abertos, como se fosse uma amiga íntima de longo tempo.

      Sei não, mas eu acho que o sotaque mineiro aumentou – e muito – desde que parti. Quando peguei o primeiro avião com destino à felicidade, todos chamavam o centro de Belo Horizonte de cidade. O trólebus subia a Rua da Bahia, as pessoas tomavam Guarapan, andavam de Opala, ouviam Fagner cantando Manera Fru Fru, Manera, chamavam acidente de trombada e a polícia de Radio Patrulha.

      Como pode, meu filho mais velho, que nasceu tão longe de Beagá, e, que hoje mora lá, me ligar e perguntar:

      - E ai pai, tudo jóia, tudo massa?

      A repórter Helena de Grammont, quando ainda trabalhava no Show da Vida, voltou encantada de lá e veio logo me perguntar se o sotaque mineiro era mesmo assim ou se estavam brincando com ela. Helena estava no carro da Globo, procurando um endereço perto de Belo Horizonte, quando perguntou para um guarda de trânsito se ele poderia ajudá-la. A resposta veio de imediato.

      - Cê ségui essa istrada toda vida e quando acabá o piche, cê quebra pra lá e continua siguino toda vida!

      Já virou folclore esse negócio de mineiro engolir parte das palavras. Debaixo da cama é badacama, conforme for é confórfô, quilo de carne é kidicarne, muito magro é magrilin, atrás da porta é trádaporta, ponto de ônibus é pôndions, litro de leite é lidileiti, massa de tomate é mastumati e tira isso daí é tirisdaí.

      Isso é verdade. Um garoto que mora em São Paulo foi a Minas Gerais e voltou com essa: Lá deve ser muito mais fácil aprender o português porque as palavras são muito mais curtas.

      Mineiro quando para num sinal de trânsito, se está vermelho, ele pensa: Péra. Se pisca o amarelo: Prestenção. Quando vem o verde: Podií.

      Mas não é só esse sotaque delicioso que o mineiro carrega dentro dele. Carrega também um jeitinho de ser.

      A Gabi, amiga nossa mineira, que mora em São Paulo há anos, toda vez que vem, aqui em casa, chega com um balaio de casos de Minas Gerais.

      Da última vez que foi a Minas, ela viu na mesa de café da tia Teresa uma capinha de crochê, cobrindo a embalagem do adoçante. Achou aquilo uma graça e comentou com a tia prendada. Pra quê? Tem dias que Teresa não dorme, preocupada querendo saber qual é a marca do adoçante que a Gabi usa, pra ela fazer uma capinha igual, já que ela gostou tanto. Chega a ligar interurbano pra São Paulo:

      - Num isquéci de mi falá a marca do seu adoçante não, preu fazê a capinha de crocrê procê...

      Coisa de mineiro.

      Bastou ela contar essa história que a Catia, outra amiga mineira – e praticante – que estava aqui em casa também, contar a história de um doce de banana divino que comeu na casa da mãe, dona Ita, a última vez que foi lá. Depois de todos elogiarem aquele doce que merecia ser comido de joelhos, ela revelou o segredo:

      - Cês criditam que eu vi um cacho de banana madurin, bonzin ainda, no lixo do vizinho, e pensei: Genti, num podêmo dispidiçá não!

      Mais de quarenta anos depois de ter deixado minha terra querida, o jeito mineiro de ser me encanta e cada vez mais.

      Quer saber o que é ser mineiro? No final dos anos 80, quando o meu primeiro casamento se acabou, minha mãe, que era uma mineira cem por cento, queria saber se eu já “tinha outra”, como se diz lá em Minas Gerais. Um dia, cedo ainda, ela me telefonou e, ao invés de perguntar assim, na lata, se eu já tinha um novo amor, usou seu modo bem mineiro de ser:

      - Eu tava pensâno em comprá um jogo de cama procê, mas tô aqui sem sabê. Sua cama nova é di casal ou di soltero?


ADAPTADO. VILLAS, Alberto. Oh! Minas Gerais. In: Carta Capital. Publicado em 10 fev. 2017. Disponível em https://www.cartacapital.com. br/cultura/oh-minas-gerais.  

Considerando o texto Oh! Minas Gerais, em relação à variedade linguística, assinale a alternativa correta.
Alternativas
Respostas
1046: A
1047: A
1048: E
1049: A
1050: A