Considere que um Estado, na condição de acionista controlado...

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Q1941407 Direito Administrativo
Considere que um Estado, na condição de acionista controlador em uma sociedade de economia mista, esteja sendo acusado de abuso de poder de controle em razão da adoção de um programa de tarifa social para determinado segmento de usuários, com potencial de redução dos lucros da companhia em relação às projeções feitas pelos acionistas minoritários. De acordo com as disposições do Estatuto Jurídico das Empresas Estatais (Lei nº 13.303/2016) e da Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/1976), o acionista controlador da referida sociedade de economia mista
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De início, façamos a apresentação da solução jurídica para o caso narrado pela banca, com indicação das normas pertinentes. Em seguida, serão analisadas as opções lançadas. Vejamos:


Nos termos do art. 238 da Lei 6.404/76, é legítimo que a pessoa jurídica controladora de sociedade de economia mista oriente as atividades da companhia no sentido de que sejam atendidos os interesses públicos com base nos quais a própria entidade restou criada.


A propósito, confira-se o citado preceito legal:

"Art. 238. A pessoa jurídica que controla a companhia de economia mista tem os deveres e responsabilidades do acionista controlador (artigos 116 e 117), mas poderá orientar as atividades da companhia de modo a atender ao interesse público que justificou a sua criação. "


Inexiste óbice normativo, ademais, a que, eventualmente, a perseguição do atingimento desses mesmos interesses coletivos acarrete, em certa medida, a redução de lucratividade da companhia, tal como seria o caso ora analisado.


No ponto, convém trazer à colação lição doutrinária de Hely Lopes Meirelles, na linha da qual, embora possam perseguir o lucro, este não é o objetivo principal do Estado, ao criar empresas públicas e sociedades de economia mista, mesmo no caso de serem exploradoras de atividades econômicas. Confira-se:


"Tais empreendimentos, ainda quando voltados à prestação de serviço público, admitem lucro, e devem mesmo produzi-lo, para seu desenvolvimento e atrativo do capital privado. O lucro, porém, não é objetivo principal da empresa, nem mesmo quando explore atividade econômica, pois a atuação do Estado nesta área só se justifica quando haja relevante interesse coletivo ou seja imprescindível à segurança nacional (CF, art. 173)."


De outro lado, dentre os requisitos de transparência exigidos das empresas públicas e das sociedades de economia mista, insere-se aquele versado no art. 8º, I, da Lei 13.303/2016, litteris:


"Art. 8º As empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão observar, no mínimo, os seguintes requisitos de transparência:


I - elaboração de carta annual, subscrita pelos membros do Conselho de Administração, com a explicitação dos compromissos de consecução de objetivos de políticas públicas pela empresa pública, pela sociedade de economia mista e por suas subsidiárias, em atendimento ao interesse coletivo ou ao imperativo de segurança nacional que justificou a autorização para suas respectivas criações, com definição clara dos recursos a serem empregados para esse fim, bem como dos impactos econômico-financeiros da consecução desses objetivos, mensuráveis por meio de indicadores objetivos;"


Fixadas as premissas acima, vejamos cada opção da Banca:


A) estará atuando com abuso de poder de controle caso tenha orientado, por voto de seus representantes na Assembleia de Acionistas ou no âmbito do Conselho de Administração, medida lastreada em política pública que possa reduzir a lucratividade esperada pelos acionistas da companhia.


Errado: a rigor, o que a Lei 6.404/76 define como modalidade de abuso de poder é a orientação da companhia para uma finalidade estranha ao seu objeto social ou que se mostre lesiva ao interesse nacional. No ponto, confira-se:


"Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder.

§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:

a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional;"

Ora, no caso aqui examinado, a adoção da tarifa social, em favor de determinados segmentos de usuários, ao que se extrai do enunciado, não poderia ser assim considerada. Pelo contrário, estaria em linha com o interesse público justificador de sua instituição.


Nestes termos, incorreto este item.



B) estará impedido de votar nas deliberações dos órgãos estatutários da companhia relativas à implementação de tal política pública, sob pena de incidir em conduta abusiva em razão da caracterização de conflito de interesses.

Errado: uma vez mais, partindo-se da premissa de que a providência adotada, consistente na adoção de tarifa social a certos usuários, estaria ajustada ao interesse público motivador da criação da entidade, deve-se afastar qualquer possibilidade de caracterização de conflitos de interesses.


Afinal, assim preconiza o art. 156 da Lei 6.404/76, acerca do instituto do conflito de interesses:

"Art. 156. É vedado ao administrador intervir em qualquer operação social em que tiver interesse conflitante com o da companhia, bem como na deliberação que a respeito tomarem os demais administradores, cumprindo-lhe cientificá-los do seu impedimento e fazer consignar, em ata de reunião do conselho de administração ou da diretoria, a natureza e extensão do seu interesse."

Ora, se a premissa é na linha de que a medida adotada não conflitava com o interesse da companhia, ou seja, com o interesse público justificador de sua própria criação, impõe-se rechaçar, na origem, qualquer alegação de tal espécie de conflito de interesses.


C) pode orientar os negócios da companhia de acordo com os objetivos que justificaram sua criação, ainda que com sacrifício da lucratividade, cabendo explicitar tais políticas públicas em carta annual subscrita pelos administradores contendo a indicação do correspondente impacto econômico-financeiro.


Certo: cuida-se aqui de proposição em perfeita sintonia com a norma acima indicada, razão pela qual não há equívocos a serem aqui indicados.

D) somente poderá impor aos demais acionistas da companhia a redução de lucros decorrente da implementação da referida política pública, se tal prerrogativa constar expressamente do estatuto social ou de acordo de acionistas, sob pena de caracterização de abuso de poder de controle.

Errado: conforme acima foi demonstrado, a conduta descrita não caracterizaria abuso de poder de controle, tampouco existe base normativa a condicionar a possibilidade de adoção de tal política pública a uma anterior previsão em estatuto social ou acordo de acionistas.


E) não está sujeito à responsabilização por abuso de poder de controle, podendo orientar livremente a condução dos negócios da companhia desde que observado o objeto social estabelecido na lei autorizativa. 



Errado: não é correto afirmar, genericamente, que a pessoa jurídica da administração pública, que figure como acionista controladora, não está sujeita à responsabilização por abuso de poder de controle. Apenas neste caso descrito pela Banca, a medida adotada assim não poderia ser caracterizada, conforme acima foi fundamentado.


Gabarito do professor: C

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Comentários

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Gabarito C

pode orientar os negócios da companhia de acordo com os objetivos que justificaram sua criação, ainda que com sacrifício da lucratividade, cabendo explicitar tais políticas públicas em carta anual subscrita pelos administradores contendo a indicação do correspondente impacto econômico-financeiro. 

Lei 13.303

Art. 8º As empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão observar, no mínimo, os seguintes requisitos de transparência:

I - elaboração de carta anual, subscrita pelos membros do Conselho de Administração, com a explicitação dos compromissos de consecução de objetivos de políticas públicas pela empresa pública, pela sociedade de economia mista e por suas subsidiárias, em atendimento ao interesse coletivo ou ao imperativo de segurança nacional que justificou a autorização para suas respectivas criações, com definição clara dos recursos a serem empregados para esse fim, bem como dos impactos econômico-financeiros da consecução desses objetivos, mensuráveis por meio de indicadores objetivos;

II - adequação de seu estatuto social à autorização legislativa de sua criação;

III - divulgação tempestiva e atualizada de informações relevantes, em especial as relativas a atividades desenvolvidas, estrutura de controle, fatores de risco, dados econômico-financeiros, comentários dos administradores sobre o desempenho, políticas e práticas de governança corporativa e descrição da composição e da remuneração da administração;

IV - elaboração e divulgação de política de divulgação de informações, em conformidade com a legislação em vigor e com as melhores práticas;

V - elaboração de política de distribuição de dividendos, à luz do interesse público que justificou a criação da empresa pública ou da sociedade de economia mista;

VI - divulgação, em nota explicativa às demonstrações financeiras, dos dados operacionais e financeiros das atividades relacionadas à consecução dos fins de interesse coletivo ou de segurança nacional;

VII - elaboração e divulgação da política de transações com partes relacionadas, em conformidade com os requisitos de competitividade, conformidade, transparência, equidade e comutatividade, que deverá ser revista, no mínimo, anualmente e aprovada pelo Conselho de Administração;

VIII - ampla divulgação, ao público em geral, de carta anual de governança corporativa, que consolide em um único documento escrito, em linguagem clara e direta, as informações de que trata o inciso III;

IX - divulgação anual de relatório integrado ou de sustentabilidade.

Espero ter ajudado de alguma forma =)

olha, nao tive essa matéria ainda, contudo raciocinei que as empresas pública e sociedades de economia mista são criadas geralmente pra suprir um gap no mercado...

Difícil

Acertei mesmo pelo raciocínio. Excelente questão!

Achei a questão bem feita.

Pense, as Estatais são criadas para atender finalidades públicas (interesse coletivo/imperativo de segurança nacional). Ainda que as Sociedades de Economia Mista aufiram lucro, este é secundário, porquanto se deve observar a finalidade pela qual a estatal foi criada. Se fosse possível privilegiar os dividendos em detrimento da persecução de políticas públicas haveria um desvirtuamento da atuação da estatal e captação do empresa pelos interesses dos acionistas.

Em que pese as considerações acima, a resposta também se encontra no art. 8, da Lei 13.303/16.

OBS: O acionista controlador (Estado) pode responder por abuso. Então esta atuação deve observar as balizas da lei que autorizou a criação da empresa e seu respectivo estatuto.

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