Acerca dos sentidos, das ideias e dos aspectos linguísticos ...

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Q1883771 Português
      Em O processo, a antevisão do inferno em que se transformaria a burocracia moderna, das culpas imputadas, da tortura anônima e da morte que caracterizam os regimes totalitários do século vinte já é um lugar-comum. O trucidamento (literal) de que K. tornou-se um ícone do homicídio político. “A colônia penal” de Kafka transformou-se em realidade pouco depois de sua morte, quando também os temas da aniquilação e dos “vermes”, de sua Metamorfose, adquiriram macabra realidade. A realização concreta de suas premonições, com pormenores de clarividência, está indissociavelmente relacionada às suas fantasias aparentemente desvairadas. Haveria algum sentido em pensar que, de alguma forma, as previsões claramente formuladas na ficção de Kafka, em O processo principalmente, teriam contribuído para que de fato ocorressem? Seria possível que uma profecia articulada de maneira tão impiedosa tivesse outro destino que não a sua realização? As três irmãs de K. e sua Milena morreram em campos de concentração. O judeu da Europa Central que Kafka ironizou e celebrou foi extinto de maneira abominável. Em termos espirituais, existe a possibilidade de Franz Kafka ter sentido seus dons proféticos como uma visitação de culpa, de que a capacidade de antever o tivesse exposto demais às suas emoções. K. torna-se o cúmplice, perplexo, porém quase impaciente, do crime perpetrado contra ele. Coexistem, em todos os suicídios, a apologia e a aquiescência. Como diz o sacerdote, em triste zombaria (seria mesmo zombaria?): “A justiça nada quer de ti. Acolhe-te quando vens e te deixa ir quando partes”. Essa formulação está muito próxima de ser uma definição da vida humana, da liberdade de ser culpado, que é a liberdade concedida ao homem expulso do Paraíso. Quem, senão Kafka, teria sido capaz de dizer isso em tão poucas palavras? Ou se saber condenado por ter sido capaz de fazê-lo?


George Steiner. Um comentário sobre O processo de Kafka. In: Nenhuma paixão desperdiçada. Tradução de Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Record, 2001 (com adaptações). 
Acerca dos sentidos, das ideias e dos aspectos linguísticos do texto apresentado, julgue o item a seguir.

No trecho “Como diz o sacerdote, em triste zombaria (seria mesmo zombaria?)”, os parênteses, que poderiam ser substituídos por travessões, foram empregados para isolar uma digressão feita pelo autor do texto.
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ERRADO

Conceito trazido por um colega (não me lembro o nome) em uma questão anterior:

Digressão: Pode ser caracterizada como uma porção textual que não se acha diretamente relacionada com o segmento precedente nem com o que lhe segue; entretanto, não é acidental e tampouco cria uma ruptura da coerência, na medida em que é fruto de relações de relevância tópica. Utilizado, por exemplo, na obra "Dom Casmurro" de Machado de Assis.

  • No texto:

em triste zombaria (seria mesmo zombaria?).

Veja que o vem em parênteses guarda relação com o que foi mencionado anteriormente. Portanto, não se trata de uma digressão, antes uma indagação.

GAB ERRADO

Dicionário: DIGRESSÃO - FIGURADO (SENTIDO)•FIGURADAMENTE

afastamento, desvio momentâneo do assunto sobre o qual se fala ou escreve.

CUIDADO!

Os comentários presentes nessa questão não a explanam corretamente.

A estrutura entre os parêntesis exemplifica uma oração justaposta a que se chama de interferente ou intercalada. Em palavras simplórias, esse tipo de estrutura não desempenha função sintática e vem sempre separada por vírgulas, travessões ou parêntesis. A rigor, traz subjetividade traduzida em comentário, observação de quem escreve o texto. Em boa hora, pode expressar citação, advertência, opinião, desejo, escusa, permissão ou ressalva. Nesse trecho trazido, o sentido é ressalva. Nada tem que ver com digressão.

Errado.

Em Literatura, digressão é um recurso utilizado pelo narrador para afastar a atenção sobre alguma ação da história principal. Desta forma, o narrador pode iniciar um tema secundário pouco importante para a trama, ou refletir sobre um assunto que foge da narrativa principal.d

O escritor brasileiro Machado de Assis recorre frequentemente a esse artifício. Nas obras “Dom Casmurro” e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, é evidente a utilização desse recurso, quando as narrações das personagens são interrompidas pelo autor para que este se dirija ao leitor com algum comentário marginal à história. Fonte: https://www.significados.com.br/digressao/

No que se refere à questão, nota-se que o termo entre parêntese está relacionado a oração precedente, logo não há digressão.

 Na digressão, a narração da história é interrompida e o contador faz comentários e observações que se distanciam temporariamente dos eventos que estavam sendo relatados.

EXEMPLO DE DIGRESSÃO:

No Cap. II de Dom Casmurro, 1º parágrafo, ele diz: "Agora que expliquei o título, passo a escrever o livro. Antes disso, porém, digamos os motivos que me põem a pena na mão."

Antes de contar ao leitor a história, ele dá-se ao trabalho de explicar por que resolveu contá-la e até mesmo por que deu ao livro o nome de Dom Casmurro.

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