O texto seguinte servirá de base para responder à questão.
Brasil se prepara para produzir combustível
sustentável de aviação
No fim de 2023, um Boeing 787 da companhia aérea
britânica Virgin Atlantic voou de Londres a Nova York
movido 100% a combustível sustentável. O primeiro voo
transatlântico de uma grande aeronave comercial a não
usar uma gota sequer do querosene de aviação de base
fóssil ganhou manchetes e foi chamado de histórico.
Segundo a empresa, o combustível alternativo feito à
base de óleo de cozinha usado e gordura animal,
misturado a 12% de querosene aromático sintético − de
origem não fóssil −, proporcionou uma redução de até
70% nas emissões de gases de efeito estufa (GEE), em
comparação com um voo no mesmo trecho usando
querosene de aviação tradicional.
Para fazer o voo de demonstração, a Virgin Atlantic
obteve uma autorização especial. Hoje, as companhias
aéreas podem misturar em seus tanques um máximo de
50% de combustível sustentável de aviação, mais
conhecido pela sigla SAF (sustainable aviation fuel),
seguindo normas estabelecidas pela Sociedade
Americana de Testes e Materiais (ASTM) e pela Agência
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
(ANP).
O SAF pode ser obtido a partir de diferentes rotas
tecnológicas e com matérias-primas que vão de
oleaginosas a etanol e resíduos sólidos urbanos. Em
comum, todos os insumos têm carbono, que é o principal
percursor dos hidrocarbonetos constituintes do SAF. A
ideia é que os aviões sejam abastecidos com querosene
de aviação ou SAF − ou uma mistura dos dois. Isso
porque a molécula de SAF é praticamente idêntica à do
querosene de base fóssil, o que dispensa modificações
nos motores dos aviões e na infraestrutura de
abastecimento.
A restrição a uma mistura de SAF superior a 50% se dá
por questões de segurança. "Nem todas as rotas de SAF
produzem na sua composição uma quantidade suficiente
de hidrocarbonetos do tipo aromático, importantes para
impedir uma mudança na viscosidade do combustível ou
o congelamento do líquido em grandes altitudes", explica
o engenheiro mecânico Fernando Catalano, diretor da
Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de
São Paulo (Eesc-USP).
O querosene fóssil é uma mistura de hidrocarbonetos de
vários tipos e leva em geral entre 10% e 25% de
aromáticos, considerados poluentes, mas necessários.
"É um problema ainda não resolvido, mas que deverá ser
superado com o tempo", diz Catalano, destacando outros
dois entraves para o emprego de SAF em ampla escala
no momento: a produção global, ainda muito pequena
ante a demanda, e o custo, estimado entre três e cinco
vezes o do querosene de aviação.
A brasileira Embraer também tem realizado ensaios com
SAF em seus aviões. Em junho de 2022, um jato
comercial E195-E2 da companhia voou com 100% do
biocombustível em um de seus dois motores. Mais
recentemente, em outubro de 2023, dois jatos executivos
da fabricante de São José dos Campos decolaram em
um voo de teste apenas com o combustível sustentável
de aviação em seus tanques.
O SAF é a grande aposta do setor aéreo para reduzir de
forma mais rápida a sua pegada de carbono. Os
estados-membros da Organização da Aviação Civil
Internacional (Oaci) aprovaram em 2022 uma meta
global de zerar as emissões de carbono do setor até
2050. No final de 2023, em uma reunião nos Emirados
Árabes Unidos, os estados-membros se comprometeram
a reduzir as emissões de CO2 da aviação internacional
em 5% até 2030.
Em 2023, foram produzidos mais de 600 milhões de litros
de SAF, o dobro do ano anterior, de acordo com a
Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata). A
produção deve triplicar este ano. Apesar do aumento,
esse volume representará apenas 0,53% da demanda
global por combustível de aviação. Estados Unidos,
China, Japão, Singapura, Alemanha, Noruega e México
já fabricam o insumo.
Em uma indústria global que ainda engatinha, o Brasil
tem uma oportunidade de se colocar como ator central,
vislumbram especialistas − seja pela experiência do país
com a produção de biocombustíveis, seja pela
quantidade de biomassa disponível para a fabricação de
SAF. "Se há um lugar no mundo em que a produção em
larga escala de SAF vai dar certo, é no Brasil",
pressupõe a bioquímica Glaucia Mendes Souza, do
Instituto de Química da USP e membro da coordenação
do Programa FAPESP de Pesquisa em Bionergia
(Bioen).
Retirado e adaptado de: JONES, Frances. Brasil se prepara para
produzir combustível sustentável de aviação. Revista Pesquisa
FAPESP.
Disponível em:
https://revistapesquisa.fapesp.br/brasil-se-prepara-paraproduzir-combustivel-sustentavel-de-aviacao/ Acesso em: 26 fev.,
2024.