Questões de Concurso
Sobre conjunções: relação de causa e consequência em português
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TEXTO I
Mário Sérgio Cortella
O sempre surpreendente Guimarães Rosa dizia: “O animal satisfeito dorme”. Por trás dessa aparente obviedade está um dos mais profundos alertas contra o risco de cairmos na monotonia existencial, na redundância afetiva e na indigência intelectual. O que o escritor tão bem percebeu é que a condição humana perde substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão rendendo-se à sedução do repouso e imobilizando-se na acomodação.
A advertência é preciosa: não esquecer que a satisfação conclui, encerra, termina; a satisfação não deixa margem para a continuidade, para o prosseguimento, para a persistência, para o desdobramento. A satisfação acalma, limita, amortece.
Por isso, quando alguém diz “Fiquei muito satisfeito com você” ou “Estou muito satisfeita com seu trabalho”, é assustador. O que se quer dizer com isso? Que nada mais de mim se deseja? Que o ponto atual é meu limite e, portanto, minha possibilidade? Que de mim nada mais além se pode esperar? Que está bom como está? Assim seria apavorante; passaria a ideia de que desse jeito já basta. Ora, o agradável é alguém dizer “seu trabalho (ou carinho, ou comida, ou aula, ou texto, ou música, etc) é bom, fiquei muito insatisfeito e, portanto, quero mais, quero continuar, quero conhecer outras coisas”.
Um bom filme não é exatamente aquele que, quando termina, nos deixa insatisfeitos, parados, olhando, quietos, para a tela, enquanto passam os letreiros, desejando que não cesse? Um bom livro não é aquele que, quando encerramos a leitura, permanece um pouco apoiado no colo e nos deixa absortos e distantes, pensando que não poderia terminar? Uma boa festa, um bom jogo, um bom passeio, uma boa cerimônia não é aquela que queremos que se prolongue?
Com a vida de cada um e de cada uma também tem de ser assim; afinal de contas, não nascemos prontos e acabados. Ainda bem, pois estar satisfeito consigo mesmo é considerar-se terminado e constrangido ao possível da condição do momento.
Quando crianças (só as crianças?), muitas vezes, diante da tensão provocada por algum desafio que exigia esforço (estudar, treinar, emagrecer, etc), ficávamos preocupados e irritados, sonhando e pensando: Por que a gente já não nasce pronto, sabendo todas as coisas? Bela e ingênua perspectiva. É fundamental não nascermos sabendo nem prontos; o ser que nasce sabendo não terá novidades, só reiterações. Somos seres de insatisfação e precisamos ter nisso alguma dose de ambição; todavia, ambição é diferente de ganância, dado que o ambicioso quer mais e melhor, enquanto que o ganancioso quer só para si próprio.
Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e, nunca, a criar, inovar, refazer, modificar. Quanto mais se nasce pronto, mais se é refém do que já se sabe e, portanto, do passado; aprender sempre é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos enfrentar.
Diante dessa realidade, é absurdo acreditar na ideia de que uma pessoa, quanto mais vive, mais velha fica; para que alguém quanto mais vivesse, mais velho ficasse, teria de ter nascido pronto e ir se gastando…
Isso não ocorre com gente, mas com fogão, sapato, geladeira. Gente não nasce pronta e vai se gastando; gente nasce não-pronta e vai se fazendo. Eu, no ano 2013, sou a minha mais nova edição (revista e, às vezes, um pouco ampliada); o mais velho de mim (se é o tempo a medida) está no meu passado, não no presente. Demora um pouco para entender tudo isso; aliás, como falou o mesmo Guimarães, “não convém fazer escândalo de começo; só aos poucos é que o escuro é claro”…
Disponível em https://www.pensador.com/autor/mario_sergio_cortella/.
TEXTO I
Mário Sérgio Cortella
O sempre surpreendente Guimarães Rosa dizia: “O animal satisfeito dorme”. Por trás dessa aparente obviedade está um dos mais profundos alertas contra o risco de cairmos na monotonia existencial, na redundância afetiva e na indigência intelectual. O que o escritor tão bem percebeu é que a condição humana perde substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão rendendo-se à sedução do repouso e imobilizando-se na acomodação.
A advertência é preciosa: não esquecer que a satisfação conclui, encerra, termina; a satisfação não deixa margem para a continuidade, para o prosseguimento, para a persistência, para o desdobramento. A satisfação acalma, limita, amortece.
Por isso, quando alguém diz “Fiquei muito satisfeito com você” ou “Estou muito satisfeita com seu trabalho”, é assustador. O que se quer dizer com isso? Que nada mais de mim se deseja? Que o ponto atual é meu limite e, portanto, minha possibilidade? Que de mim nada mais além se pode esperar? Que está bom como está? Assim seria apavorante; passaria a ideia de que desse jeito já basta. Ora, o agradável é alguém dizer “seu trabalho (ou carinho, ou comida, ou aula, ou texto, ou música, etc) é bom, fiquei muito insatisfeito e, portanto, quero mais, quero continuar, quero conhecer outras coisas”.
Um bom filme não é exatamente aquele que, quando termina, nos deixa insatisfeitos, parados, olhando, quietos, para a tela, enquanto passam os letreiros, desejando que não cesse? Um bom livro não é aquele que, quando encerramos a leitura, permanece um pouco apoiado no colo e nos deixa absortos e distantes, pensando que não poderia terminar? Uma boa festa, um bom jogo, um bom passeio, uma boa cerimônia não é aquela que queremos que se prolongue?
Com a vida de cada um e de cada uma também tem de ser assim; afinal de contas, não nascemos prontos e acabados. Ainda bem, pois estar satisfeito consigo mesmo é considerar-se terminado e constrangido ao possível da condição do momento.
Quando crianças (só as crianças?), muitas vezes, diante da tensão provocada por algum desafio que exigia esforço (estudar, treinar, emagrecer, etc), ficávamos preocupados e irritados, sonhando e pensando: Por que a gente já não nasce pronto, sabendo todas as coisas? Bela e ingênua perspectiva. É fundamental não nascermos sabendo nem prontos; o ser que nasce sabendo não terá novidades, só reiterações. Somos seres de insatisfação e precisamos ter nisso alguma dose de ambição; todavia, ambição é diferente de ganância, dado que o ambicioso quer mais e melhor, enquanto que o ganancioso quer só para si próprio.
Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e, nunca, a criar, inovar, refazer, modificar. Quanto mais se nasce pronto, mais se é refém do que já se sabe e, portanto, do passado; aprender sempre é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos enfrentar.
Diante dessa realidade, é absurdo acreditar na ideia de que uma pessoa, quanto mais vive, mais velha fica; para que alguém quanto mais vivesse, mais velho ficasse, teria de ter nascido pronto e ir se gastando…
Isso não ocorre com gente, mas com fogão, sapato, geladeira. Gente não nasce pronta e vai se gastando; gente nasce não-pronta e vai se fazendo. Eu, no ano 2013, sou a minha mais nova edição (revista e, às vezes, um pouco ampliada); o mais velho de mim (se é o tempo a medida) está no meu passado, não no presente. Demora um pouco para entender tudo isso; aliás, como falou o mesmo Guimarães, “não convém fazer escândalo de começo; só aos poucos é que o escuro é claro”…
Disponível em https://www.pensador.com/autor/mario_sergio_cortella/.
Ismália
Alphonsus de Guimaraens
Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.
No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...
E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...
E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...
As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...
Crise aposentou “regra de ouro” para aluguel
A crise do mercado imobiliário nos últimos anos, a dificuldade na venda de unidades e a grande oferta de imóveis para locação fizeram a "regra de ouro" usada para calcular o preço do aluguel ficar ultrapassada. Hoje, o valor a ser cobrado pelo aluguel de um imóvel é motivo de preocupação para muitos proprietários – é preciso achar um ponto de equilíbrio entre quanto o dono gostaria de cobrar pelo aluguel e quanto o futuro inquilino está disposto a pagar.
Esse cálculo sempre envolve comparação de preços de imóveis semelhantes, consulta a corretores e jogo de cintura na hora de negociar com o novo locatário. O mercado costumava usar como regra uma conta simples: a referência era cobrar pelo aluguel cerca de 0,5% do valor de venda do imóvel. Por essa conta, um apartamento avaliado em R$ 500 mil poderia ser alugado por cerca de R$ 2,5 mil.
Durante os anos de crise, que afetaram duramente o setor, os preços de venda pararam de subir e o mercado de locação foi inundado por imóveis que não foram vendidos, fazendo com que os reajustes de aluguel variassem bem abaixo da inflação. Se o engenheiro Milton Fontoura, de 63 anos, tentasse alugar seu apartamento na Barra Funda, em São Paulo, usando a "regra de ouro", ficaria com ele fechado. O imóvel custa R$ 800 mil, mas Fontoura anunciou o aluguel por R$ 2,9 mil. "A locação está melhorando, principalmente para quem tem um imóvel perto de estação de metrô. Até consigo alugar rapidamente, mas o preço em comparação com o de venda não é o mesmo de dez anos atrás".
A Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) calcula todos os meses a taxa de rentabilidade do aluguel. O último ano em que o retorno com a locação chegou a 0,5% do preço de venda foi 2013, antes do início da recessão, em 2014. No ano passado, o valor de aluguel passou a representar, em média, 0,37% do valor de venda.
Uma comparação ajuda a entender como os preços de venda e de locação se comportaram de maneiras diferentes na crise. Em janeiro de 2015, o valor de venda dos imóveis havia subido 12,7%, em 12 meses, segundo a Fipe. Em 2017, último ano da crise, esse valor de venda havia caído apenas 0,74%, também em 12 meses. Enquanto isso, as locações, que subiam 1,6% em janeiro de 2015, caíram 2,9% em janeiro de 2017. "O preço de aluguel é mais sensível ao mercado. O valor de locação caiu bastante durante a crise, teve três anos de queda e só voltou a subir no ano passado em termos nominais. Enquanto isso, o preço de venda ficou estagnado", resume o economista Bruno Oliva, da Fipe.
Segundo o economista do Grupo Zap, Sergio Castelani, o primeiro passo para quem precisa calcular o valor de locação do imóvel, e não pode contratar um profissional para fazer a avaliação, é olhar os sites que publicam os preços por metro quadrado por bairro. "Por mais que os imóveis sejam diferentes, é sempre bom olhar no próprio prédio e fazer uma avaliação honesta dos pontos fortes e fracos do imóvel e da conservação. O preço, por mais que se mude, não é tão descontínuo assim", diz.
Disponível em: https ://economia.uol.com.br/noticias /estadao-conteudo/2019/02/18/crise-aposentou-regra-de-ouro-para aluguel.htm. Acesso em: 10 fev. 2020. [Adaptado]
Para responder à questão, considere o parágrafo abaixo.
Segundo o economista do Grupo Zap, Sergio Castelani, o primeiro passo para quem precisa calcular o valor de locação do imóvel, e não pode contratar um profissional para fazer a avaliação, é olhar os sites que publicam os preços por metro quadrado por bairro. "Por mais que os imóveis sejam diferentes, é sempre bom olhar no próprio prédio e fazer uma avaliação honesta dos pontos fortes e fracos do imóvel e da conservação. O preço, por mais que se mude, não é tão descontínuo assim", diz.
O parágrafo está interligado aos parágrafos anteriores por meio
Texto para a questão.
TEXTO I
Desumano é quem perdeu a capacidade de ver o outro como ser humano
Por Élio Gasda*
A desumanização é um processo que reduz a essência humana no indivíduo até eliminá-la. Desumanizar é eliminar restrições morais à crueldade. Agressões a animais despertam mais comoção e revolta do que a violência e a morte de crianças. Pessoas tratam seus bichos de estimação como filhos e apoiam linchamentos, chacinas e tortura. Desumano é quem perdeu a capacidade de ver o outro como ser humano. Uma sociedade desumanizada é aquela que define um grupo humano como não-humano, e que permite que esse grupo seja eliminado ou tenha negado seus direitos. Descartar pessoas tornou-se um fenômeno.
Sociedade desumana trata atos desumanos com banalidade. Um ato mau torna-se banal quando é vivenciado como se fosse comum. Monstruosidades tornam-se fatos corriqueiros por meio da superficialidade do agente e da descartabilidade da vítima. Quanto mais superficial alguém for, mais provável será que ceda ao mal. (...)
O servilismo também ajuda a entender a desumanização. O adesismo de parcelas da sociedade, mesmo aquelas formadas nos princípios morais, é um fato. Um povo torna-se cúmplice da loucura do sistema na medida em que partilha das suas mentiras. Além de ser enganado, se recusar em saber a verdade. Ao formatar os seres humanos, o sistema os desumaniza para apenas encaixá-los na sua engrenagem. Os efetivamente responsáveis que se sentem culpados pelos tempos sombrios (Hannah Arendt) são poucos.
A voz da consciência nos interpela sobre a responsabilidade de nossos atos. Podemos ouvir essa voz? Ainda temos acesso ao acervo de princípios éticos que nos alerta sobre o processo de desumanização em curso? Não precisamos mais fechar os ouvidos para a voz de uma consciência que incorporou o discurso da sociedade respeitável, a voz das “pessoas de bem”. São “humanos direitos” que não têm remorso. A desumanização não se origina do desconhecimento, mas da irreflexão. Entre todas as características, a mais determinante da desumanização é a incapacidade de pensar, de distinguir o certo do errado, a verdade da mentira. A superficialidade dos discursos medíocres avaliza a maldade. Acreditar é mais fácil do que pensar. É difícil pensar por si mesmo. A maioria repete o que lhes é dito. Conformistas, não aprenderam a duvidar. Resignados à ignorância dos lugares comuns.
Ubi dubium ibi libertas (onde há dúvida, há liberdade). Pensar é sair da mesquinhez do cotidiano, é refletir sobre os acontecimentos e dar significados. É buscar a verdade dos fatos por vias racionais. São muitas as informações, mas não se pensa sobre elas. O pensamento é diálogo silencioso consigo mesmo. Não é passividade, mas ação revolucionária. A desumanização impõe o desafio de educar para o pensamento imune aos clichês. Transmitir conhecimentos é imprescindível, mas educar para o pensamento é uma urgência.
O ódio desumaniza. No livro 1984 de George Orwell, os agentes do Grande Irmão assistiam sessões de ódio coletivo. Aparecia na tela a figura humana a odiar, e todos se sentiam transtornados por ela. A mídia parece servir-se dos mesmos procedimentos. Como definir aqueles que celebram a barbárie em um país que trata pessoas pior do que animais? Quem os ensinou a odiar? O ódio afeta o cérebro, emburrece. Quem odeia não tolera divergências. Não existem adversários, todos são inimigos. O ódio não faz parte da essência humana. Aprende-se a odiar (Mandela). (...)
Para você, quanto vale a vida dos ninguéns? “Menos do que a bala que os mata?” (Eduardo Galeano). Se eu não me importo com ninguém, alguém se importará comigo? Ninguém se humaniza desumanizando o outro. Somente psicopatas torcem para que pessoas morram ou sofram. Quem te deu o salvo-conduto para desejar a morte de alguém? Porque Jesus não foi. “É amando que o humano dá o melhor de si” (Nietzsche). Nada acima do ser humano. Nenhum ser humano abaixo de outro.
“Acreditar é mais fácil do que pensar. É difícil pensar por si mesmo”.
A bela velhice
Há uma geração que está rejeitando estereótipos e criando novos significados para o envelhecimento
No livro “A velhice”, Simone de Beauvoir, após descrever o dramático quadro do processo de envelhecimento, aponta um possível caminho para a construção de uma “bela velhice”: ter um projeto de vida.
No Brasil, temos vários exemplos de “belos velhos”: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Ney Matrogrosso, Chico Buarque, Marieta Severo, Rita Lee, entre outros.
Duvido que alguém consiga enxergar neles, que já chegaram ou estão chegando aos 70 anos, um retrato negativo do envelhecimento. São típicos exemplos de pessoas chamadas “ageless” ou sem idade.
Fazem parte de uma geração que não aceitará o imperativo: “Seja um velho!” ou qualquer outro rótulo que sempre contestaram.
São de uma geração que transformou comportamentos e valores de homens e mulheres, que tornou a sexualidade mais livre e prazerosa, que inventou diferentes arranjos amorosos e conjugais, que legitimou novas formas de família e que ampliou as possibilidades de ser mãe, pai, avô e avó.
Esses “belos belhos” inventaram um lugar especial no mundo e se reinventaram permanentemente.
Continuam cantando, dançando, criando, amando, brincando, trabalhando, transgredindo tabus etc. Não se aposentaram de si mesmos, recusaram as regras que os obrigariam a se comportarem como velhos. Não se tornaram invisíveis, apagados, infelizes, doentes, deprimidos.
Eles, como tantos outros “belos velhos” que tenho pesquisado, estão rejeitando os estereótipos e criando novas possibilidades e significados para o envelhecimento.
Em 2011, após assistir quatro vezes ao mesmo show de Paul McCartney, perguntei a um amigo de 72 anos: “Por que ele, aos 69 anos, faz um show de quase três horas, cantando, tocando e dançando sem parar, se o público ficaria satisfeito se ele fizesse um show de uma hora?”. Ele respondeu sorrindo: “Porque ele tem tesão no que faz”.
O título do meu livro “Coroas” é uma forma de militância lúdica na luta contra os preconceitos que cercam o envelhecimento. Tenho investido em revelar aspectos positivos e belos da velhice, sem deixar de discutir os aspectos negativos.
Como diz a música de Arnaldo Antunes, “Que preto, que branco, que índio o quê? /Somos o que somos: inclassificáveis”. Acredito que podemos ousar um pouco mais e cantar: “Que jovem, que adulto, que velho o quê? / Somos o que somos: inclassificáveis”.
Mirian Goldenberg é antropóloga, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de “Corpo, envelhecimento e felicidade” (Ed. Civilização Brasileira).
Folha de S. Paulo. São Paulo, 16 out. 2012. Equilíbrio.
Apartir da leitura do texto “Proteção para os jornalistas” (Correio da Paraíba, 19/01/2020), responda à questão.
Em pesquisa sobre corrupção, a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) reforça a
necessidade de garantir a liberdade de expressão e, consequentemente, proteger os profissionais da
imprensa. O objetivo do documento “Corrupção e Direitos Humanos” é o de apresentar uma análise do
fenômeno da corrupção dentro da perspectiva dos direitos humanos, levando em conta o cenário dos
países que compõem o continente americano. A partir disso, a Comissão demonstra que a corrupção
afeta os direitos humanos na medida em que enfraquece instituições democráticas e os governos,
aumenta a desigualdade social a partir da impunidade e também anula o estado de direito. Segundo o
relatório, que foi divulgado em dezembro de 2019, a importante contribuição dos jornalistas para
fiscalizar a conduta e buscar pela transparência da administração pública acaba os colocando em
situações de vulnerabilidade. São mencionados os casos de Héctor Félix Miranda e Victor Manuel
Oropeza, jornalistas do México que apuravam casos de corrupção e foram assassinados em 1999.
Também é citado o jornalista Aristeu Guida da Silva, que denunciou casos de corrupção de funcionários
públicos, e foi assassinado em 2016, no Brasil.
No trecho transcrito abaixo, a oração iniciada pela locução “na medida em que” imprime ao período o sentido de:
“[...] A partir disso, a Comissão demonstra que a corrupção afeta os direitos humanos na medida em que enfraquece instituições democráticas e os governos, aumenta a desigualdade social a partir da impunidade e também anula o estado de direito [...]”.
“Sei que aquele sinal é um sinal de pedestre e, como vivemos sob a tirania do automóvel, ele abre e fecha muito rápido.”
[...] Hannah Arendt foi a pensadora responsável por sua formulação – vazio do pensamento – em um livro chamado Eichmann em Jerusalém, de 1962, no qual ela faz um relato filosófico sobre o julgamento de um alto funcionário do regime nazista alemão que, no entanto, não chegava a ser um dos seus principais mentores. Adolf Eichmann que foi capturado na Argentina e julgado em Jerusalém por seus crimes contra a humanidade, estarreceu o mundo ao se apresentar como um cidadão de bem que pretendia apenas subir na carreira alegando cumprir ordens. No livro ela afirma que Eichmann não demostrava refletir sobre o que havia feito como funcionário. É como se sua capacidade de pensar estivesse interrompida. Questionado ele respondia por clichês e, ao mesmo tempo, não era um sujeito perverso que estivesse utilizando algum tipo de inteligência para fazer o mal conscientemente.
Foi por analisar a figura de Eichman que Arendt lançou a questão do vazio do pensamento. A característica dessa forma de vazio é a ausência de reflexão, de crítica, de questionamento e até mesmo de discernimento. Podemos dizer que, em nossa época, isso se torna cada vez mais comum. O número de pessoas que abdicam da capacidade de pensar é cada vez maior.
No entanto, parece absurdo que possamos viver sem pensamento e é justamente por isso que o uso de ideias prontas se torna a cada dia mais funcional como já acontecia com Eichmann. Hoje, as redes sociais sobrevivem principalmente pelo fluxo das ideias prontas. Pessoas se tornam a cada dia transmissoras de ideias não questionadas. Ideias que são como mercadorias compradas para viagem sem perguntar que sentido podem ter na vida de quem as leva consigo.
No campo da publicidade e propaganda, os profissionais especializam-se em apresentar as ideias rarefeitas, não apenas como coisas superficiais, mas como algo que está ao alcance da mão, algo cuja complexidade não importa. As próprias ideias são consumidas. Há um consumismo das coisas, mas há também um consumismo das ideias e, nesse sentido, também da linguagem por meio da qual as ideias circulam. Ora, o estatuto das coisas em um mundo voltado ao hiperconsumo é o do descarte. Seriam as ideias descartáveis como as coisas junto às quais elas são vendidas? Ou as ideias que seriam primeiramente abstratas serviriam apenas para dar uma “aura” às coisas que, em si mesmas, as coisas não têm?
A partir disso, podemos falar de uma segunda forma de vazio que caracteriza o nosso mundo cada vez mais carente de reflexão. Ele diz respeito ao que sentimos. Vivemos em um mundo cada vez mais anestesiado, no qual as pessoas se tornam incapazes de sentir e cada vez mais insensíveis. A sociedade na qual vivemos parece cada vez mais excitada, angustiada e fadada ao desespero. Podemos falar de um vazio da emoção justamente no contexto em que as pessoas buscam, de modo ensandecido, uma emoção qualquer. Paga-se caro pela falta de sentimentos que podemos definir em um sentido genérico como uma frieza generalizada. A incapacidade de sentir torna o campo da sensibilidade em nós, um lugar de desespero. Da alegria à tristeza, queremos que a religião, o sexo, os filmes, as drogas, os esportes radicais e até mesmo a alimentação provoque mais do que sentimentos. Deseja-se o êxtase. A emoção também virou uma mercadoria e o que não emociona radicalmente parece não valer o esforço de se viver. O ódio é uma emoção fundamental em nossa época. Para quem não consegue sentir nada, a sua radicalidade é uma estranha redenção.
Nesse contexto, as mercadorias surgem com a promessa de garantir êxtase. Espera-se hoje que as experiências humanas sejam sempre e cada vez mais intensas, cinematográficas, impressionantes e espetaculares mesmo que se trate apenas de uma roupa nova, um telefone celular, um brinquedo ou um lugar para comer, tudo é vendido como se não fosse apenas o que de fato é. É o império da emoção contra a chateação, da excitação contra o tédio, da rapidez contra o tempo natural das coisas, da festividade contra a tranquilidade, da ebriedade contra a sobriedade.
Ora, quando falamos de emoções tendemos a considerar que elas são espontâneas. Mas nada é realmente espontâneo no mundo da sociedade publicitária. Tudo isso é contrabalançado por programações do pensar e do sentir. As emoções também são programadas. E a questão que está em jogo é a do esvaziamento afetivo em um cenário de frieza humana e expressão histérica. Mas se as pessoas estão cada vez mais frias, isso quer dizer também que elas estão necessariamente cada vez mais “robotizadas” por pensamentos e sentimentos programados. [...]
(TIBURI, Márcia. 23 de julho de 2019. Disponível em: https://
revistacult.uol.com.br/home/nos-e-o-vazio-sobre-o-pensamento-emocao-e-acao/. Adaptado.)
Acerca da expressão destacada em “ela faz um relato filosófico sobre o julgamento de um alto funcionário do regime nazista alemão que, no entanto, não chegava a ser um dos seus principais mentores” (1º§), marque V para as afirmativas verdadeiras e F para as falsas.
( ) Trata-se de um adjunto conjuntivo utilizado como recurso de coesão textual.
( ) Possui mobilidade posicional na frase mantendo-se a coesão e coerência textuais.
( ) A relação estabelecida por “no entanto” expressa, no período, uma inferência, conclusão.
( ) A ressalva indicada pela expressão “ no entanto” pode ser também expressa pelo vocábulo “enfim”.
A sequência está correta em
Leia o texto I para responder à questão.
Bonecas negras representam apenas 6% dos modelos disponíveis no mercado
Bonecas negras representam apenas 6% dos modelos fabricados pelas principais marcas que comercializam esses brinquedos no Brasil, de acordo com o levantamento Cadê Nossa Boneca, feito pela organização Avante – Educação e Mobilização Social. O percentual é inferior aos 7% registrados no levantamento feito em 2018.
O levantamento foi feito em agosto deste ano, em sites de comércio virtual de 14 dos 22 fabricantes de brinquedos associados a Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq). Segundo a pesquisa, oito sites estavam em manutenção. Dentre as empresas analisadas, apenas oito possuíam bonecas negras nos respectivos inventários. Em todos eles, segundo o estudo, a proporção de modelos de bonecas negras em relação às bonecas brancas é inferior a 20%.
“Se sair na rua e olhar o comércio, você vai saber”, diz a psicóloga, consultora associada da Avante e uma das idealizadoras da campanha Ana Marcílio. “Você conta as bonecas na vitrine, conta as lojas com vitrine com bonecas pretas e depois conta o número de bonecas em cada loja, você vai ver que é irrisório”, acrescenta.
O movimento Cadê Nossa Boneca nasceu do sonho de Ana Marcilio, Mylene Alves e Raquel Rocha, de verem vitrines mais diversas e brinquedos que de fato representassem a sociedade brasileira, que de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tem 56,1% da população formada por pessoas negras. O levantamento foi feito em 2016, 2018 e agora, em 2020 e a porcentagem de modelos disponíveis no mercado pouco mudou. Em 2016 era 6,3, passando para 7% e, agora, para 6%.
Ana explica que é na infância que as crianças constroem o imaginário, daí a importância que, em uma sociedade majoritariamente negra, isso seja retratado como algo positivo. Ter apenas referenciais brancos, magros e loiros faz com que se entenda que esse é o referencial de beleza. “O impacto da boneca é esse. Da boneca preta também é esse. Imagina ter rastas, blacks, uma diversidade de cortes e penteados afro descendentes e africanos, diversos tipos de tranças, ter tudo isso em uma vitrine, uma vitrine toda diversificada. A criança vai querer ter aquele cabelo, vai achar aquele cabelo bonito”, diz.
O impacto de crianças, sejam elas brancas ou negras, terem acesso a bonecas de cores diversas pode chegar na fase adulta, ajudando a combater o racismo, de acordo com a psicóloga. “Se a gente não tiver esse imaginário simbólico, como é que a gente vai quebrar o racismo? O racismo se materializa nas mortes que a gente tem, nas inúmeras vidas ceifadas precocemente, seja pela inoperância do sistema público na saúde e educação, seja nas mortes através das polícias e milícias, que têm dizimado as periferias. A construção do imaginário tem tudo a ver com o número de mortes e violência que a gente vive nesse país e no mundo afora”, diz.
Fonte: https://www.brasil247.com
“A construção do imaginário tem tudo a ver com o número de mortes e violência que a gente vive nesse país e no mundo afora”.
A palavra destacada é: