[...] "Retomemos a nossa investigação e
procuremos determinar, à luz deste fato de que todo
conhecimento e todo trabalho visa a algum bem, quais
afirmamos ser os objetivos da ciência política e qual é
o mais alto de todos os bens que se podem alcançar
pela ação. Verbalmente, quase todos estão de acordo,
pois tanto o vulgo como os homens de cultura superior
dizem ser esse fim a felicidade e identificam o bem viver
e o bem agir como o ser feliz. Diferem, porém, quanto
ao que seja a felicidade, e o vulgo não o concebe do
mesmo modo que os sábios. Os primeiros pensam que
seja alguma coisa simples e óbvia, como o prazer, a
riqueza ou as honras, muito embora discordem entre
si.[...] Ora, alguns têm pensado que, à parte esses
numerosos bens, existe um outro que é
autossubsistente e também é causa da bondade de
todos os demais. [...]
Chamamos de absoluto e incondicional aquilo
que é sempre desejável em si mesmo e nunca no
interesse de outra coisa. Ora, esse é o conceito que
preeminentemente fazemos da felicidade. É ela
procurada sempre por si mesma e nunca com vistas em
outra coisa, ao passo que à honra, ao prazer, à razão e
a todas as virtudes nós de fato escolhemos por si
mesmos (pois, ainda que nada resultasse daí,
continuaríamos a escolher cada um deles); mas
também os escolhemos no interesse da felicidade,
pensando que a posse deles nos tornará felizes.
A felicidade, todavia, ninguém a escolhe tendo
em vista algum destes, nem, em geral, qualquer coisa
que não seja ela própria. [...] Mas é preciso ajuntar
'numa vida completa'. Porquanto uma andorinha não
faz verão, nem um dia tampouco; e da mesma forma
um dia, ou um breve espaço de tempo, não faz um
homem feliz e venturoso."
ARISTÓTELES. Ética a Nicônaco. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
p. 251, 254-6. (Coleção Os Pensadores).
(acesso 18/07/2019)