Questões Militares de Português - Figuras de Linguagem
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Texto 3
A INCAPACIDADE DE SER VERDADEIRO
Paulo tinha fama de mentiroso. Um dia chegou em casa dizendo que vira no campo dois dragões da independência cuspindo fogo e lendo fotonovelas. A mãe botou-o de castigo, mas na semana seguinte ele veio contando que caira no pátio da escola um pedaço de lua, todo cheio de buraquinhos, feito queijo, e ele provou e tinha gosto de queijo. Desta vez Paulo não só ficou sem sobremesa, como foi proibido de jogar futebol durante quinze dias. Quando o menino voltou falando que todas as borboletas da Terra passaram pela chácara de Siá Elpídia e queriam formar um tapete voador para transportá-lo ao sétimo céu, a mãe decidiu levá-lo ao médico. Após o exame, o Dr. Epaminondas abanou a cabeça: "Não há nada a fazer, Dona Coió. Este menino é mesmo um caso de poesia".
{Carlos Drummond de Andrade, Histórias para o Rei - 10a ed. - Rio de Janeiro: Record, 2007)
Selfies
Muita gente se irrita, e tem razão, com o uso indiscriminado dos
celulares. Fossem só para falar, já seria ruim. Mas servem também para tirar
fotografias, e com isso somos invadidos no Facebook com imagens de gatos
subindo na cortina, focinhos de cachorro farejando a câmera, pratos de
torresmo, brownie e feijoada. Se depender do que vejo com meus filhos - dez e
12 anos -, o tempo dos “selfies” está de todo modo chegando ao fim. Eles já
começam a achar ridícula a mania de tirar retratos de si mesmos em qualquer
ocasião. Torna-se até um motivo de preconceito para com os colegas.
“'Fulaninha? Tira foto na frente do espelho.” Hábito que pode ser
compreensível, contudo. Imagino alguém dedicado a melhorar sua forma física,
registrando seus progressos semanais. Ou apenas entregue, no início da
adolescência, à descoberta de si mesmo.
A bobeira se revela em outras situações: é o caso de quem tira um
“selfie” tendo ao fundo a torre Eiffel, ou (pior) ao lado de, sei lá, Tony
Ramos ou Cauã Reymond.
Seria apenas o registro de algo importante que nos acontece - e
tudo bem. O problema fica mais complicado se pensarmos no caso das fotos de
comida. Em primeiro lugar, vejo em tudo isso uma espécie de degradação da
experiência.
Ou seja, é como se aquilo que vivemos de fato - uma estada em
Paris, o jantar num restaurante - não pudesse ser vivido e sentido como aquilo
que é.
Se me entrego a tirar fotos de mim mesmo na viagem, em vez de
simplesmente viajar, posso estar fugindo das minhas próprias sensações. [...]
Pode ser narcisismo, é claro. Mas o narcisismo não precisa viajar
para lugar nenhum. A complicação não surge do sujeito, surge do objeto. O que
me incomoda é a torre Eiffel: o que fazer com ela? O que fazer de minha relação
com a torre Eiffel?
Poderia unir-me a paisagem, sentir como respiro diante daquela
triunfal elevação de ferro e nuvem, deixar que meu olhar atravesse o seu duro
rendilhado que fosforesce ao sol, fazer-me diminuir entre as quatro vigas
curvas daquela catedral sem clero e sem paredes.
Perco tempo no centro imóvel desse mecanismo, que é como o
ponteiro único de um relógio que tem seu mostrador na circunferência do
horizonte. Grupos de turistas se fazem e desfazem, há ruídos e crianças.
Pego, entretanto, o meu celular: tiro uma foto de mim mesmo na
torre Eiffel. O mundo se fechou no visor do aparelho. Não por acaso eu brinco,
fazendo uma careta idiota: dou de costas para o monumento, mas estou na verdade
dando as costas para a vida.
[...]
Talvez as coisas não sejam tão desesperadoras. Imagine-se que
daqui a cem anos, depois de uma guerra atômica e de uma catástrofe climática
que destruam o mundo civilizado, um pesquisador recupere os “selfies” e as
fotos de batata frita.
“Como as pessoas eram felizes naquela época!” A alternativa seria
dizer: “Como eram tontas! Dependerá, por certo, dos humores do pesquisador.
COELHO, Marcelo. Disponível em: <http://www1 .folha. uol.com.br/fsp/ilustrad
a/162525- selfies.shtml>. Acesso em 19 mar. 2017
Observe as frases a seguir, classifique-as de acordo com a figura de linguagem correspondente e assinale a opção que apresenta a sequência correta.
I- Vi com os meus próprios olhos o que aconteceu.
II- As ondas gemem ao encontro das pedras
III- Ouço o tique-taque do seu coração ao me encontrar.
IV- Ontem, entreguei a alma a Deus.
V- Eu só quero rir meu riso sem julgamento.
O presbítero Eurico era o pastor da pobre paróquia de Carteia. Descendente de uma antiga família bárbara, gardingo1 na corte de Vítiza, depois de ter sido tiufado2 ou milenário3 do exército visigótico vivera os ligeiros dias da mocidade no meio dos deleites da opulenta Toletum. Rico, poderoso, gentil, o amor viera, apesar disso, quebrar a cadeia brilhante da sua felicidade. Namorado de Hermengarda, filha de Favila, duque de Cantábria, e irmã do valoroso e depois tão célebre Pelágio, o seu amor fora infeliz. O orgulhoso Favila não consentira que o menos nobre gardingo pusesse tão alto a mira dos seus desejos. Depois de mil provas de um afeto imenso, de uma paixão ardente, o moço guerreiro vira submergir todas as suas esperanças. Eurico era uma destas almas ricas de sublime poesia a que o mundo deu o nome de imaginações desregradas, porque não é para o mundo entendê-las. Desventurado, o seu coração de fogo queimou-lhe o viço da existência ao despertar dos sonhos do amor que o tinham embalado. A ingratidão de Hermengarda, que parecera ceder sem resistência à vontade de seu pai, e o orgulho insultuoso do velho prócer4 deram em terra com aquele ânimo, que o aspecto da morte não seria capaz de abater. A melancolia que o devorava, consumindo-lhe as forças, fê-lo cair em longa e perigosa enfermidade, e, quando a energia de uma constituição vigorosa o arrancou das bordas do túmulo, semelhante ao anjo rebelde, os toques belos e puros do seu gesto formoso e varonil transpareciam-lhe a custo através do véu de muda tristeza que lhe entenebrecia a fronte. O cedro pendia fulminado pelo fogo do céu.
Educado na crença viva daqueles tempos; naturalmente religioso porque poeta, foi procurar abrigo e consolações aos pés d’Aquele cujos braços estão sempre abertos para receber o desgraçado que neles vai buscar o derradeiro refúgio. Ao cabo das grandezas cortesãs, o pobre gardingo encontrara a morte do espírito, o desengano do mundo. A cabo da estreita senda da cruz, acharia ele, porventura, a vida e o repouso íntimos?
O moço presbítero, legando à catedral uma porção dos senhorios que herdara juntamente com a espada conquistadora de seus avós, havia reservado apenas uma parte das próprias riquezas. Era esta a herança dos miseráveis, que ele sabia não escassearem na quase solitária e meia arruinada Carteia.
(Alexandre Herculano. Eurico, o presbítero, 1988)
1 gardingo: nobre visigodo que exercia altas funções na corte dos príncipes
2 tiufado: o comandante de uma tropa de mil soldados, no exército godo
3 milenário: seguidor da crença de que a segunda vinda de Cristo se daria no ano 1000
4 prócer: indivíduo importante, influente; magnata
A dor do mundo
Por muito tempo achei – escrevi e disse – que os males humanos foram sempre mais ou menos os mesmos, e que a loucura toda já contamina o nosso café da manhã pelo universo cibernético. As aflições, as malandragens, as corrupções, os assassinatos absurdos, os piores aleijões morais, tudo é meu, seu, nosso pão de cada dia. Mas, de tempos para cá, comecei a achar que era lirismo sentimental meu. Estamos bem piores, sim. Por sermos mais estressados, por termos valores fracos, tortos ou nenhum, porque estamos incrivelmente fúteis e nos deixamos atingir por qualquer maluquice, porque até nossos ídolos são os mais transtornados, complicados. Nossos desejos não têm limite, nossos sonhos, por outro lado, andam ralinhos. Temos manias de gourmet, mas não podemos comer. Vivemos mais tempo, mas não sabemos o que fazer com ele. Podemos ter mais saúde, mas nos intoxicamos com excesso de remédios. Drogas habituais não bastam, então usamos substâncias e doses cavalares.
A sexualização infantil é um fato e começa em casa com mães amalucadas e programas de televisão pornográficos a qualquer hora do dia. O endeusamento da juventude a enfraquece, os adolescentes lidam sozinhos com a explosão de seus hormônios e a permissividade geral que anula limites e desorienta.
”(...)”
Uma cantora pop, que me desinteressava pela aparência e por algumas músicas, morre, mata-se, por uso desmedido de drogas (álcool sendo uma delas) aos 27 anos. Logo se exibe (quase com orgulho, ou isso já é maldade minha?) uma lista de brilhantes artistas mortos na mesma idade pela mesma razão. Nas homenagens que lhe fazem, de repente escuto canções lindas, com uma voz extraordinária: mais triste ainda, pensar que esse talento se perdeu.
“(...)”
Viramos assassinos ao volante, de preferência bêbados. Nossos edifícios precisam ter portarias treinadas como segurança, nossas casas, mil artifícios contra invasores, andamos na rua feito coelhos assustados. Não há lugar nas prisões, então se solta a bandidagem, as penas são cada vez mais brandas ou não há pena alguma. Pena temos nós, pena por nós, pela tão espalhada dor do mundo. Sempre falando em trilhões, brigando por quatrilhões, diante da imagem das crianças morrendo de fome na Etiópia, na Somália e em outros países, tão fracas que não têm mais força para engolir o mingau que alguma alma compadecida lhes alcança: a mãe observa apática as moscas que pousam no rostinho sofrido. Estou me repetindo, eu sei, talvez assim alivie um pouco a angústia da também repetida indagação: que sociedade estamos nos tornando?
Eu, recolhida na ponta inferior deste país, sou parte dela e da loucura toda: porque tenho alguma voz, escrevo e falo, sem ilusão de que adiantará alguma coisa. Talvez, como na vida das pessoas, esta seja apenas uma fase ruim da humanidade, que conserva fulgores de solidariedade e beleza. Onde não a matamos, a natureza nos fornece material de otimismo: uma folha de outono avermelhada que a chuva grudou na vidraça, a voz das crianças que estão chegando, uma música que merece o termo “sublime”, gente honrada e produtiva, ou que cuida dos outros. Ainda dá para viver neste planeta. Ainda dá para ter esperança de que, de alguma forma, algum dia, a gente comece a se curar enquanto sociedade, e a miséria concreta não mate mais ninguém, enquanto líderes mundiais brigam por abstratos quatrilhões.
(Lya Luft – Revista Veja – Edição 2228 – ano 44 – nº 31 – 3 de agosto de 2011)
Seria Escrever
Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cinzenta, quando lesse minha história no jornal, risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse: Ai, meu Deus, que história mais engraçada!. E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida de moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria: mas essa história é mesmo muito engraçada!
Rubem Braga. Disponível em: <http://www.releituras.com/ rubembraga_meuideal.asp/fragmento>. Acesso em: 20 out. 2016.
Leia com atenção as três estrofes da Canção da Polícia Militar de Santa Catarina
Letra e música: Ten Cel Roberto Kel.
“I
Na grandeza do nosso passado
Na bravura que o tempo guardou
Nossa Farda é um atestado
Que o heroísmo já glorificou
A defesa da Lei e dos lares
Essa Farda nos faz garantir
Os deveres são nossos altares
Destinados ao crime banir
Estribilho
Salve PM Catarinense
O teu nome havemos de honrar
Na batalha que o bem sempre vence
Para a Lei na vanguarda ficar
Na batalha que o bem sempre vence
Para a Lei na vanguarda ficar
II
Quer na paz patrulhando a cidade
Quer na guerra ou em pleno sertão
Onde faça mister a verdade
Onde faça mister a razão
Ao tombarem a serviço da Lei
Nossos bravos heróis destemidos
Esquecidos soldados da grei
Jamais sejam por nós esquecidos”
Leia com atenção as três estrofes da Canção da Polícia Militar de Santa Catarina
Letra e música: Ten Cel Roberto Kel.
“I
Na grandeza do nosso passado
Na bravura que o tempo guardou
Nossa Farda é um atestado
Que o heroísmo já glorificou
A defesa da Lei e dos lares
Essa Farda nos faz garantir
Os deveres são nossos altares
Destinados ao crime banir
Estribilho
Salve PM Catarinense
O teu nome havemos de honrar
Na batalha que o bem sempre vence
Para a Lei na vanguarda ficar
Na batalha que o bem sempre vence
Para a Lei na vanguarda ficar
II
Quer na paz patrulhando a cidade
Quer na guerra ou em pleno sertão
Onde faça mister a verdade
Onde faça mister a razão
Ao tombarem a serviço da Lei
Nossos bravos heróis destemidos
Esquecidos soldados da grei
Jamais sejam por nós esquecidos”
A autoria do excerto componente da gravura, creditado à Cora Coralina, não tem confirmação em sua
bibliografia; no entanto, é certo que, ao pedir um favor ao vento, o eu lírico emprega a figura de
linguagem denominada