Leia a crônica de Marcos Rey para responder à questão.
Salas de espera
Mesmo com decoração agradável, ar-refrigerado, sorrisos de uma atendente sexy, ficar plantado numa sala de
espera é mais chato do que campeonato de boliche. Seus
personagens não são muito variados: crianças que não
param de se mexer; enxeridos loucos pela intimidade das
pessoas; leitores compulsivos de revistas...
Mas houve uma sala de espera terrível na minha vida.
Precisava de emprego. Desesperadamente. Não fora o primeiro a chegar, sempre há os que chegam antes. Fiquei
horas com os olhos fixos na porta da esperança. O mais
madrugador entrou como se fosse dono do emprego, saiu de
cabeça baixa, perdidão. O segundo, que levava à mão um
currículo enorme, deixou a entrevista picando-o com ódio em
mil pedacinhos.
Minha vez. Entrei trêmulo, pálido, derrotado. O empresário abriu os braços, sorrindo. Conhecia-me. Conhecia-o.
Rodolfo! Não o sabia também dono daquilo! Meu dia de sorte!
– É você? Aqui está seu maior fã! Li dois livros seus. Minha
mulher disse que sairá outro. Serei o primeiro a comprar.
Abraçados, senti que o mundo afinal acolhia este
aquariano.
– Estava na sala de espera desde as 2, Rodolfo.
– Por que não mandou me avisar? Eu o receberia imediatamente. Não calcula como o admiro.
– Agora estou precisando de um emprego, amigo. A vida
está dura.
– Dura? Está duríssima! Insuportável – confirmou, com
uma pequena ressalva – mas não para os artistas. Vocês
não sofrem nossos problemas. Devem rir da gente, reles
homens de negócio. Como gostaria de ter talento para escrever! Viveria com pouco dinheiro, porém feliz. Eu aqui sou um
mártir dos números.
– O que poderia me arranjar, Rodolfo? Estou encalacrado. Qualquer coisa serve – revelei humilde.
Ele lançou-me um olhar mais sábio do que compadecido:
– Eu não o desviaria de sua vocação com um empreguinho. Conserve-se fora da maldita engrenagem.
E confessou:
– Hoje ganhei o dia, vendo-o. Vou acompanhá-lo ao
elevador.
– Mas Rodolfo...
– Faço questão.
(Coleção melhores crônicas – Marcos Rey.
Seleção Anna Maria Martins. Global, 2010. Adaptado)